31 de julho de 2012

Casca



Caminho por um sonho distante. E andei pensando: se tirarem isso, o que sobra de mim? O que vai restar de um garoto sem atrativos, se este “dom” me for tirado? É disso que vivo para persistir: meu talento para a escrita. Foi isso que Deus me deu, a única coisa que eu sei fazer de melhor – não o melhor de todos, pois sei que há pessoas com esse dom bem mais enfático e evidente. Foi isso o que Ele me deu, em compensação a todo o resto que me falta: beleza, astúcia, esperteza. Sou desprovido de tantas coisas, cansaria de escrever uma lista enumerando as atividades para que não levo jeito. Lidar com as pessoas, agir diante de algumas; ser atrapalhado, tímido, bobo e inútil para uma pancada de tarefas. Eu não levo jeito, mas há algo que me movimenta interiormente e que me trás a este teclado, me fazendo digitar feito um louco sem limites. Não sou o melhor no que faço (volto a repetir), mas é a melhor coisa que sei fazer;  a única que dá certo, da qual faço impecavelmente a ponto de tirar elogios de uma multidão de conhecidos. Foi o que Deus me deu, apenas isso e nada mais. E aí eu fico pensando: se este dom me for tirado, o que vai sobrar de mim? Aonde irão meus sonhos de ser um escritor no mínimo reconhecido – é, eu sei, falta muito até lá e há muitas toneladas a se aprender. O que vai sobrar de mim? O que vai sobrar de uma pessoa que só é admirada pelo ato de escrever? Se isso me faltasse, acho que eu perderia até alguns amigos ou amores. Fico a refletir todo santo dia sobre o assunto. Por que Deus me proporcionou isso? Com que razão e motivo? Isso, é claro, levando em consideração a real existência de Deus, mas não vem ao caso... Eu só tenho medo de perder tudo isso, porque talvez seja apenas uma fase da adolescência. Aí um dia, quando eu acordar, esse “escritor” meia tigela terá morrido e quem vai despertar no dia seguinte? E por que diabos sei fazer uma coisa bem, mas não consigo dar uma continuação digna à ela, digitando parágrafos de livros que nunca serão terminados ou disseminados? Pra quê viver esse sonho que me estrangula todo santo dia? Pra quê ser um Felipe que as pessoas só amam pelo fato de ser “bom com as palavras”, se um dia eu posso parar de escrever e esse amor todo a que sou submetido possa vir a sumir? No fim, se o escritor mixuruca aqui dentro um dia morrer, então eu serei apenas aquela casca sem atrativos que venho sendo desde sempre. Uma casca descartável sem valor algum. É disso que tenho medo.

Pernas alvas



De novo esteve aqui, dessa vez, no entanto, mais intensa. Embora não pudesse alcançar com o toque da mão, apenas com o afagar dos olhos. Estava lá, com pernas longas e alvas, esbeltas para me queimar de desejo. Um sentimento puro, um desejo de te tocar devagar, sem infringir a carne, apenas contemplativo. Para toda uma eternidade, pois eu ainda de ti conservo uma visão de respeito e admiração. Tão linda diante de mim, poderosa e – quase – inalcançável, porque hoje sobre isso eu nem mais sei, não sei mais. Aí orbita um universo misterioso, por trás desse sorriso brilhante e olhar perdido. Intenções estranhas que só você entende, no fundo de um possível turbilhão... É, talvez nem exista um, e isso é só coisa da minha cabeça. Mas da minha cabeça você estava lá, eu te via e você me arrancou uma felicidade súbita. É assim que de ti eu lembro: Pernas alvas, esguias, magras e aterradoramente magníficas. Lindas e belas.