29 de dezembro de 2013

Eu sou infantil



Mais uma afirmação vinda de mim... Opa, melhor dizendo, de vocês: eu sou muito infantil. Sim, eu sou. Devo ser, não é? Sobretudo por escrever em um blog e falar sobre idiotices que alguns de vocês, senhores e senhoras superiores, julgam coisa de menininha - sim, não discordo, inclusive partilho da mesma visão, pena o mundo continuar confundindo mera visão poética e dramatização para a construção literária com ingenuidade. Não que eu me incomode tanto quanto antes, mas ainda assim continua sendo um demasiado aperto nas bolas. Sério. O que raios vocês têm na cabeça? Decerto meio mundo acha que sou desses bobinhos que só por dizer “estou apaixonado” realmente está apaixonado, mas ao menos poderiam se dar ao luxo de notar a brincadeira proposital usada pela ironia; decerto meio mundo acha, também, que escrever belos textos sobre garotas aleatórias signifique que me jogo de cabeça em qualquer mínimo flerte feito comigo – e que sou infantil, que fantasiarei uma bela e longa história de amor numa simples ocasião de troca de saliva ou fluídos corporais. Sim, é, é isso. Só porque me dou ao trabalho de construir boas frases e tenho um pouco de tato para tal, não significa que eu seja uma menininha de doze anos desenhando corações em volta do nome do amado ou da amada – visto que até a classificação do sentimento está sendo feita de forma errada. Sim, devo ser infantil e ingênuo – e o sou, já que a verdade absoluta está com e em cada coisa por vocês dita. E isso me irrita, me irrita pra caralho, porque além de ser pouco beneficiado com o dom da testosterona inerente a qualquer homem – menos a mim, é claro, com cara de pirralho e corpo de criança –, sou muito menos levado a sério por escrever aqui essas coisas e ser visto como “leviano”, “ingênuo”, “infantil”, “diz que ama, mas nem sabe o que é isso”. Pois tanto faz, que se foda o mundo e suas percepções distorcidas, seus pré-julgamentos infundados e suas más interpretações certeiras apenas em equívocos. Eu ligo, mas sempre caguei – caso contrário já teria largado estas palavras, este blog e este quem sou. No fim, devo ser infantil por justamente não ser panaca, preconceituoso, burro e analfabeto como todos vocês, que insistem ler coisas erradas e distorcer minhas palavras. É por isso que repito a intenção deste texto, tantas e tantas vezes: me divirto olhando o circo pegar fogo, me faço de bobo e dou de ombros. Nas palavras de Tywin Lannister: “Os maiores idiotas são às vezes mais espertos do que os homens que deles riem”. 

19 de dezembro de 2013

Leviano



Eu sou leviano, meu coração é fraco, mole e vagabundo, tão frágil quanto um acúmulo de areia brevemente condensado. Metáforas à parte, essa é a verdade, um mal que me compele há tempos, do qual não consigo manter as rédeas e, lógico, merecedor de toda minha carga dramática para a composição destas palavras. Vocês também são assim? Há quem confunda minha brincadeira sobre “estar apaixonado” com o ato sólido e direto de se apaixonar, assim como – as mesmas pessoas – confundem com suas puras ignorâncias o meu ato de “admirar” com uma “corrida ao banheiro”. Queria eu que todos parassem, por um segundo, de julgar minha fútil e desprezível pessoa e entendessem a visão poética que me acomete. Certa vez, escrevi aqui sobre as costas de uma garota, falei sobre acariciá-la, nua, na cama, beijá-la e dedicá-la todo o carinho mais simplório e babaca de um homem e, adivinhem só? Fui taxado como tarado por deturpar leviana e frequentemente uma simples costa, imaginar feitos sexuais brutos e, como sempre, “horas e horas no banheiro”. Não sei se é sobre a visão poética ou sobre ter um coração leviano; não sei se é sobre ser um tarado à solta que olha algumas mulheres de maneira diferente (o que automaticamente já me torna leviano, no sentido sexual e psicótico da coisa); não sei se é sobre o desconhecimento que alguns sempre terão sobre enxergar o mundo com olhos distintos; no fundo, também não sei se é sobre escritores ou metidos a escritores sempre serem mal compreendidos, mal interpretados por suas linhas retas e sinuosas que os mal avisados insistem em trilhar erroneamente; escritores – ou metidos a escritores – têm disso, certo?  Suas entrelinhas, suas metáforas, suas analogias cíclicas e substituições de termos serão lidas com análises ferrenhas e maldosas, por receptores que enxergam borboletas no lugar de mariposas ou vermelho no lugar do carmesim – porque saiba você ou não, há sim uma distinção, e na poesia, friso, pequenas distinções podem significar imensos abismos separados por léguas de distância. E talvez tudo isso me torne leviano: interpretações erradas, julgamentos inapropriados sob ordens religiosas que insistem em dizer “não julgarás”. E talvez – esta é a parte boa – só por isso eu continue a escrever textos ambíguos e significados triplos, com a singela intenção de soar verídico em minhas levianas paixões e com a ácida intenção de jogar uma faísca na cobertura que cobre o espetáculo de suas mentes - o que me torna leviano, no fim, é adorar ver o circo de todos vocês pegar fogo.

15 de dezembro de 2013

É por mim



Agora é por mim, é por minha conta, é para mim. Há muito tempo deixei de fazer isso, há muito tempo julguei-me incapaz e perdedor. Não há ninguém neste mundo que desacredite em minha própria capacidade do que eu mesmo, e não há ninguém nesse mundo que mais saiba o quanto sou capaz do que eu mesmo. Eu sei, não é força de vontade, não é pensamento positivo – bostas assim ficam para aqueles que nada temem, que nada querem dramatizar, para aqueles que amam a natureza e sentem sua essência no cérebro, pulmões e olhos; bostas assim são para pessoas zens que, acredite, me irritam mais que tudo; “eu nunca dou ouvidos pra alguém que chega assim do nada, achando que tudo tá tranquilo o tempo todo”. O que eu sei sobre mim mesmo, no fundo, é a mais pura certeza, a mais pura crença, enquanto que o pessimismo serve, sobretudo, para elevar a humildade – e funciona. A melhor parte nisso, é olhar para trás e ver meu eu de antes, lembrar o quanto ele sonhou e o quanto ele foi capaz de alcançar esses sonhos. Talvez você nem sequer lembre, mas eu disse que tinha feito aquilo por você, que tudo era por você, por um futuro que eu te alcançaria e meus sonhos se concretizariam. Bem, eu tentei; eu tentei por alguns segundos, tentei por alguns minutos, e consegui por longos e arrastados meses – concretizei tudo aquilo que havia prometido, eu cumpri. Não importa o rumo negativo que a história tenha tomado, eu disse que faria e fiz, mas eu o fiz por você, e minha missão cumprida foi também o início do meu declínio. Declinei e sofri, mas no fim, nunca verdadeiramente estive na merda como sempre ousei dizer. Eu me reergui e estou aqui, agora, esculpindo essas palavras que daqui a algumas semanas poderão me fazer rir de orgulho ou de irônico deboche. Mas eu tentarei, estou tentando, tentando e sempre tentando, sempre tentando, independente do quão depressivo aparente ser ou o quão pessimistas soem minhas palavras escritas. Isto eu jamais poderei chorar no futuro: jamais reclamarei a dor de não ter tentado. Agora, muito diferente do que um dia eu fui e como agi, livre de críticas, piadas, risadas ou mágoas. Mesmo que te não tenha nada a ver com declínios e fracassos, agradeço profundamente, porque no fim, se eu não tivesse tentado por você, lutado por você, e fracassado por nós, talvez eu sequer estivesse aqui tentando novamente por mim. Dane-se a perspectiva do egocentrismo, agora é só por mim – e por ninguém mais.

8 de dezembro de 2013

A força de uma mulher




Expliquem-me algo, expliquem-me isto: por que elas são tão sólidas, indobráveis feito ferro, e nós tão fracos, quebradiços e submissos? Homens começam a fazer e dizer besteiras, se afogam, pouco se importam com a vida, largam de mão e desabam, agarram a desgraça com todas as forças. Mulheres? Mulheres sofrem, não disse aqui que elas também não choram, não falei que são criaturas frias e calculistas, não. Falo aqui da capacidade inerente de terem forças, serem mil vezes mais capazes de abrir um sorriso em meio à dor e dizerem: "posso vencer", e de fato vencem. Mulheres são tão admiráveis, que entre a arte de esconderem mil segredos, o mais bem guardado são as lágrimas – falo de mulheres, me refiro a mulheres de verdade, tenham elas doze, vinte ou setenta anos. Aliás, nem todas as mulheres são mulheres, como nem todas as meninas são meninas. Há uma mulher forte dentro de poucas adolescentes, adultas e idosas, mas há sempre, sempre, um menino fraco, chorão e sensível dentro de qualquer homem. Não há distinções para nós, porque é um sentimento geral, afirmo aqui algo que nunca presenciei em meu pouco tempo de vida: nunca vi um homem à prova de mulher, nunca vi um homem forte perante a dor da distância ou do término, nunca vi um homem agir racionalmente diante da dor. Isso sempre fará de nós meros meninos bobos e infantis, todos serviçais dos encantos femininos. Nunca teremos a força para esquecê-las, nunca teremos a força que elas possuem, pois mulheres superam, mulheres sempre sobem mais um degrau, afastam o passado – nós; eu, você ou ele... – de seus corações e são capazes de ressurgir para uma nova vida. E quanto nós? E quanto a mim? E quanto a você, caro amigo? Queria eu compreender a magnificência do sexo oposto, queria eu possuir um terço dessa força que elas possuem, para no mínimo aliviar a dor no peito e tentar querer ter uma nova vida, porque nem isso nós tentamos. Estamos sempre presos e acorrentados, com medo não de uma nova ferida, mas com medo de esquecer, com medo de sermos infiéis entre todas as nossas falhas e infidelidades mais vis e superficiais. Exalto as mulheres, exalto aquelas que conseguem ter essa força ou que lutam por ela, que superam um amor e conseguem viver outro de maneira mais forte, vívida ou boba, mas o fazem com maestria e perfeição. A força de uma mulher é incomparável, imensurável e inesgotável. A força de um homem? A minha força? Somos apenas pobres beberrões que choramingam a falta de uma única mulher e fazem disso a ladeira para todas as merdas futuras e atitudes de mal caráter.
Não, não justifico nossos erros, explico apenas nossa instintiva e genética fraqueza. Porque explicar os erros é assunto para outra hora. Ah, sim, isso é conteúdo para outro texto...

5 de dezembro de 2013

Vida vazia





 ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­  Deve ser esta vida vazia, deve ser essa rotina que não muda e não acrescenta nada. Deve ser o meu desânimo por viver, o meu desânimo em ir lá fora e fazer o que sempre quis. Devem ser minhas limitações corporais, minha estima baixa e o ódio que costumo por mim mesmo, a imagem que odeio no espelho e minha exímia capacidade de julgar cada ação inferior a tudo e todos. Sim, é isso. Deve ser minha falta de sorte, deve ser a doença que me acomete um dos órgãos junto à doença que me acomete a cabeça, os olhos e o peito. Devem ser essas limitações impostas em casa, impostas pela vida. Deve ser essa vontade de encher a cara, beber, beber e beber, mas sabr que qualquer dia isso acabará me amputando uma perna ou pior – e vi tanta gente próxima a mim morrer disso. Deve ser de fato minha saúde fraca agindo com todas as outras limitações familiares, deve ser minha covardia em impor minha palavra e ser um pouco mais impulsivo. Deve ser tudo isso: tantas coisas que me desanimam mais e mais, me fazem perder a fé em mim mesmo... Esperem, precisei rir disso. Fé eu na vida pouco tive – desde criança –, fé em mim mesmo, então? Esperem, ainda estou rindo. O problema é tão simples e complicado ao mesmo tempo que nem sei como nasceu, onde cresceu ou como piorou. Devem ser tantas coisas que nem me importo em tratar ou buscar uma solução, eu só fico aqui para morrer, esperando o dia em que isso finalmente me aplacará. E não, eu não estou reclamando, pois ainda quero viver o bastante para terminar de ler uma lista de livros e escrever algumas histórias. Não que eu pense em enrolar uma corda no pescoço, não, isso é besteira, o cúmulo do inaceitável. São tantas coisas que, sinceramente, nem sei mais o que devem ser. Já não me importo, é só que incomoda. Incomoda nessa monotonia do quarto e da casa, sem poder sair, sem poder ou querer encontrar um sentido.
 ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­  É uma vida tão cheia de coisas, mas uma vida vazia.

21 de novembro de 2013

O pesadelo romântico




 ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­  Metáfora perfeita. Não para a criação de belas estrofes, não pela criação do perfeito poema, e sim pela descrição da terrível realidade: não poder tocar, não poder sentir, não poder beijar. Estar próximo, ouvir a respiração, o eco da risada, o brilho dos olhos e o ondular dos cabelos - querer sentir, querer apalpar, por um segundo apenas ou por um momento contínuo, eterno e enganoso, seja nas Terras do sonho, seja na triste realidade. Você já esteve tão perto e tão distante ao mesmo tempo?  Você já esteve na típica situação de um romântico maldito? Já participou dessa realidade imensurável, sem aromas, sem cores, sem toques, ternuras e sabores? Já perdeu tudo em um estalar de dedos? Tec. Tec. Tão próximo da realização, tão próximo da felicidade, tendo em vista diante de si uma pessoa promissora, repleta de metas e perseverança, trazendo consigo um punhado de esperança. Olhos castanhos, com novamente a mesma pele clara de antes, cabelos escuros e sorriso agora mais devoto. E, no entanto, exatamente como nos lamentosos versos do jovem, maldito e ultrarromântico poeta, suas palavras escapam a boca e tudo o que profere são piadinhas sem graça e um distanciamento da atenção - até pode ser tudo, até pode ser encantador, até pode reconhecer as próprias capacidades com a mais singela humildade, mas, diante dela, não passa de mais um abutre querendo esmigalhar a carne entre as pernas com bicadas ferozes e sujas. Então ela te escapa - o momento sublime da contemplação, o clímax negativo no romance. Você a vê girando os pés e sendo acolhida por alguém tão melhor, tão mais animado e menos ridículo. Você perdeu, jovem rapaz, perdeu novamente. Pela brecha observou-a gemer e suspirar numa fração de segundos, deitada na cama ou na verde relva à espera do ideal que seria você, mas foi apenas um sonho onde seus pés correm devagar e a voz some dentro da garganta. Estica a mão. Esmaga o ar. Corre. Corre. Não sai do lugar. Grita. Grita. Grita o silêncio de mil inocentes. Escorrega ante a margem. Cai. Afunda. Despenca e a perde - não necessariamente nessa ordem.
  ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­  Vê-a partir, sob um forma diferente, sob um nome diferente, sob um rosto distinto. Como todas as outras -  exatamente como todas as outras, sempre assim. De novo e de novo.


11 de novembro de 2013

Jovem demais





 ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­  Eu não vou me explicar de novo, porque você jamais entenderia, a idade e as experiências não permitem. Ninguém trilha o mesmo caminho ou bebe da mesma água que passa sob a ponte, portanto, acredito eu, você jamais entenderá como minha cabeça funciona. Talvez chegue perto, mas como a própria filosofia define: ninguém enxerga de forma igualitária o mesmo objeto de observação. Você é tão jovem, jovem demais, e isso que sente, a princípio, não passa do fogo desesperado que é a paixão. Não, não é amor, talvez não ainda. Só o tempo dirá. Não se ama do dia para a noite, não se ama em uma semana. Ama-se durante o tempo, garota, em meio às dores, às decepções e à carência de racionalidade ao caminhar para o abismo, mesmo sabendo que há ali um poço sem fundo. Existe ainda a grande questão do rótulo e essa necessidade monstruosa de um relacionamento para que Deus e o mundo vejam. É necessário? Ninguém aqui se esconde, demonstremos a todos o nosso afeto, que seja, eu não me importo com isso, mas forçar algo ante os olhos da sociedade já é leviano, superficial e urgente, desnecessário. Minha história faz de mim não um projeto de homem cauteloso e frio, mas sim extremamente ciente do que sente e quer. E a digo: relacionamento forçado e amor como nas linhas de Shakepeare? Não. Não, não é assim. Já fiz mil e um discursos sobre o quanto a felicidade independe de amor ou de rótulos sociais; a alegria não está em três palavras ditas, e sim nos gestos desmedidos ou desprovidos de vergonha, pressão e inconsciência duvidosa. Você é jovem demais para alcançar essa compreensão, até eu sou jovem demais e de aprendizado ainda tenho muito a agregar, mas no pouco que vivi, extraí o máximo de lições e com elas vim a este texto expressá-las.
 ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­  Garota, juro, há algo que você precisa aprender ainda, algo que ultimamente pouco anda entendendo, por mais que eu repita e repita as mesmas demonstrações de afeto. Aliás, é... Quando demonstro afeto e preocupação, você chora por eu não pronunciar simples três palavras. Maldita frase utópica. Eu já errei ao proferi-la – tinha 14 anos desde a última vez que o fiz e, de lá pra cá, quando pronunciei verdadeiramente, fui interpretado como mentiroso e tudo o que recebi foram dúvidas. Tudo o que faço é digno de dúvidas, a propósito, especialmente com você. Demonstro meu carinho, demonstro meu afeto, mas você não há de acreditar de qualquer forma, pura e simplesmente em função do meu silêncio quando questionado: “Você me ama? Por que não diz que ama?”. És jovem demais e um dia entenderá que anda agindo equivocadamente. E que fique claro uma coisa: não sou eu quem a ilude, é você mesma quem o faz, forçando-me agir com um sentimento grande demais que não surge assim de uma semana para a outra; é você mesma quem se ilude achando que “amor” é simples, rápido e arrebatador assim.
 ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­  É você quem se ilude, pequena. Talvez por ser jovem demais.


5 de novembro de 2013

Reencontre sua chuva



 ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­  Às duas da tarde ela aparece. Ainda que substantivo feminino, consegue ser surpreendentemente pontual.  Mas também traz consigo toda a força e altivez que cada mulher carrega em si. E como é gostosa, deslumbrante! A chuva brinda as tardes da terra cabana, renovando as energias de seu povo. Mas pra mim, que fui acolhido por esse chão, ela tem algo mais, algo místico. O cheiro de terra, o gosto salgado do suor do meu rosto que ela arrasta até minha boca enquanto levanto minha cabeça, admirando sua simplicidade, sua fluidez. Talvez o que me encante seja toda a vida que ela proporciona, talvez seja o fato de que, ainda que hoje seja capaz de entender todo o seu ciclo e processos, ela me leve inconscientemente a minha infância, fazendo com que ela não passe de “água que cai do céu”. Há muito não tinha um bem estar tão forte quanto o que senti hoje. Foram tempos difíceis, pra mim e para os que me cercam, e a acabo absorvendo todos os sentimentos que me cercam. A chuva é minha válvula de escape. A água é, de modo geral, mas a chuva tem um quê especial. Ela traz memórias que eu não seria capaz de recordar sozinho. Comer uma manga no fundo do quintal, brincar com o cachorro, jogar bola com os amigos e se machucar, mas rir quando vê que a chuva leva o pouco sangue perdido, junto com todas as vibrações ruins. Mãos dadas, uma prima com medo da chuva chorava, soluçava. Arrestei-a em detrimento das ordens de meus pais e tios, só pra mostrar o que realmente era a chuva e tentar fazer uma menina apavorada se vislumbrar como até hoje eu me pego vislumbrado. Seu sorriso largo e olhos semicerrados diziam tudo. Hoje ela já não tem medo. Fica impressionada? Nunca perguntei, é subjetivo, pessoal. Só me pergunto quantas pessoas ainda param pra aproveitar as pequenas coisas, as quais são as que realmente importam como diria o clichê. O texto não era pra ser sobre isso, mas os 15 minutos que eu fiquei parado na esquina de casa “pegando chuva” depois de um dia estressante, me mostraram que enquanto eu puder preservar alguns prazeres que mantinha quando pequeno, eu ainda sou capaz de entender o sentido de felicidade, por que não há nada mais sincero que a felicidade de uma criança, e a chuva fez eu me sentir uma novamente. Mais uma vez, não tenho fórmula, não afirmo que é lei, não peço que aceite. Porém, se você perdeu uns dez minutos pra ler esse texto, eu só peço uma coisa: ­ ­ ­ ­ ­ ­  ­ ­ ­ ­ ­ ­ Reencontre sua chuva.


(T.S.Banha)

30 de outubro de 2013

Ídolos



 ­ ­ ­ ­ ­ ­ Meus ídolos são quebrados: um velho sádico com monstros na cabeça; um homem morto, esguio, com distorções sobre a realidade e com monstros inomináveis também na cabeça; outro velho igualmente morto, com visões ímpares sobre as joias do mundo serem as putas e vadias, bêbados e vagabundos, venerando sexo, drogas e loucuras. Posso colocar entre eles, também, uma ou duas bichas que lideram ou lideravam uma banda de qualquer designação do rock ‘n’ roll. Quem mais coloco? Não me vem à mente. Todos ligados à arte, a maioria deles escritores e nenhum necessária ou profundamente religioso. Talvez acreditem em Deus, assim como eu, claro, mas não em sua forma convencional como aquele livro que todos veneram insiste em transmitir. Afinal, é só um livro, tem seu valor histórico, psicológico e espiritual, mas é só um livro escrito por homens antigos levados por um frenesi esquizofrênico que julgaram ser epifanias divinas. Meu ídolo não é um livro, meu ídolo não é um Deus. Meus ídolos falam sempre de pecados, morte, sangue, suicídio, terror, medo, vitória, perseverança, ideologia, sonhos e esperança. Ainda assim são considerados quebrados pela maioria puritana. Não sou um reflexo deles. Diria o contrário, aliás, eles são um reflexo de mim, não me tornei o que sou por causa deles, não, não. Na realidade, só os procurei porque sou assim, procurei-os porque em algum momento pensaram analogamente, eles foram o que sou há muito tempo, aceitaram a si mesmos e foram felizes em suas desgraças, dores e tragédias. Não sou produto deles, mais precisamente falando, eu diria que cada um deles é minha consequência, não minha causa. Tão quebrados quanto eu - por isso os venero tanto.

29 de outubro de 2013

Eu não vou sorrir




 ­ ­ ­ ­ ­ ­ Eu não vou sorrir, porque simplesmente não sou o bastardo mentiroso que tanta gente insiste em ser. Não, esqueça, eu não vou sorrir. Sorrisos me agradam... Quando vêm dos outros, claro. Um sorriso meu, por outro lado, pode ser breve, mas jamais refletirá um estado longínquo de alma. Não sou falso o suficiente para mentir sobre minha realidade plena. E estou bem assim – sem cortes nos pulsos, balas no tambor, cordas no teto ou pílulas sobre a mesa. Bem melhor que muitos sorrisos mentirosos por aí, que só fazem esconder a realidade por trás de si mesmos. Uma coisa é ser verdadeiramente sorridente, outra totalmente diferente é querer pagar a imagem de “feliz” para cumprir com a ditadura da felicidade que nos massacra. Ditadura, sim, “sorria, seja feliz, caso contrário te rebaixaremos, você será a pior espécie, renegado pelos olhos alheios e criticado por falsos moralistas e mentirosos que fingem felicidade suprema”. Fodam-se todos. Minha falta de sorrisos é bem mais sincera que a negra máscara que vos vestem. A vida é uma merda e nunca mudará, ao menos eu sei disso, ao menos nego a risada ante a realidade, ao menos não finjo esperanças diante de um quadro frio e escuro. Eu não vou sorrir, estou bem assim, estou bem perante minha eterna depressão. Me faz bem do meu jeito, me deixa em paz e suave. Me deixa livre das mentiras e boas – fúteis – aparências. 

28 de outubro de 2013

Ela




 ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ Ela encanta, ela seduz, ela atrai com o gingado do corpo e o rebolar da mente. Ela trás calma, desejo, ciúmes e angústia, angústia por querer tê-la, por querer prendê-la nos braços, envolvê-la em uma bolha de King e mantê-la ali, para mim. Ela tem disso: desperta o egoísmo, o desespero mais primitivo do homem, a ganância e o abismo da soberba e não querer dividi-la com nenhum abutre que ronda aqui e ali, espreitando sua genialidade e doçura com o único motivo de copular e fugir. Abutres: copular e fugir, fugir e copular, copular e fugir. Talvez eu o seja também: um tipo de abutre mais profundo, sujo e algoz, justamente por desejá-la tanto enquanto abro um sorriso e apenas balanço a cabeça, concordando com algo como se realmente estivesse prestando atenção. Ela é dessas, me desperta amor, bondade, desejo e fétidas astúcias. Ela não tem fotos de biquíni, ela não posa com o corpo dobrado em frente ao espelho, não intitula frases filosóficas em fotografias na praia mostrando a barriga ou decote, ela “cultua com os livros e ama os animais”, ela não precisa provar nada ao mundo, ela não possui corpo escultural, possui seios pequenos e pernas finas, ancas magras e pontudas. Tem algo naquela cabeça e uma coisa extremamente acolhedora nos olhos; talvez seja o modo de falar, tão calmo e meigo, extremamente carente e doce, como se o mundo nem sequer estivesse ruindo lá fora com suas morais distorcidas. Ela é ela. Considera-se feia, sem graça e pouco atraente - sorte a minha, desse modo os abutres são menos. Meu memorando um dia se tornará um livro, um romance que emplacará livrarias ao redor do globo, tão conquistador quanto o chão percorrido pelas páginas de Paulo Coelho. Quem sabe? Um romance com o nome dela, para e por Ela. Ela que está em tantos lugares, aqui e ali, lá e cá, com tantos nomes, tantas cores, olhos distintos, cabelos lisos, encaracolados, pretos e loiros, castanhos, vermelhos... Ela que vive me destruindo em fogo e acolhendo em rios.
 ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ Ela, ela e ela. Sempre ela. 



25 de outubro de 2013

Axé




­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ Ele pisou naquele chão sagrado, abençoado por todas as entidades de seus antepassados. Por ali passaram muitos pedidos, sofrimentos, agradecimentos e curiosidade, assim como a que ele sentia. Observou atento a tudo que acontecia, as músicas cantadas exaltando os Orixás nas suas línguas nativas, os movimentos feitos pelos filhos representando fielmente cada dança. O cavalo de Ogum, a procura da caça de Oxóssi, os movimentos de Xangô com seus machados. Admirou todos, mas ficou encantado com a leveza dos filhos de Ogum, a simultaneidade deles seguindo o Pai, que também incorporara. A sutileza de mãe Iemanjá no corpo de uma menina no alto dos seus 9 ou 10 anos. Mas nada se comparava a seu Orixá de cabeça, pai Xangô. Quando iniciou-se o canto, ritmado pelo som dos atabaques, sentiu uma energia que há muito não sentia, fechou os olhos e sentiu emanar por todo seu corpo. A vivacidade do movimento que faziam lhe dava energia e lhe abria um sorriso que não podia conter. Sentiu-e abraçado, acolhido por todo poder do rei de Òyó. Ao fim todos os Orixás que deram a honra de sua presença, entram comandados pelo Babalorixá, filho de Oxóssi, que faz sua dança final e passa a receber os que puderam presenciar toda sua altivez. Então, eis que entra na fila, meio a contragosto, mas querendo participar de toda aquela festa. A energia que o cerca ferve e o esquenta de tal forma que ele passa a suar. É tão grande que mal consegue manter-se de olhos abertos e bambeia de um lado ao outro, lutando para receber o comprimento do Orixá. Chega sua vez. Ele fecha o olho para bater cabeça e mostrar respeito àquela entidade. Quando abre, sem entender, já está recebendo o abraço de Oxóssi. Não se lembra do meio tempo. Branco, vazio. Depois disso, foi outro homem, pessoa. Na verdade, se sentiu um menino perante tudo aquilo. E só o que resta é a lembrança da energia que o cercou e ainda o cerca e toda a força que ele absorveu de cada Orixá que desceu para abençoar aquele momento tão especial.
­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ - Motumbá, e muito obrigado pela folha.
­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ ­ - Motumbá Axé, filho. Que Xangô continue lhe protegendo!

13 de outubro de 2013

Vomitei



Garota, eu juro, eu queria vomitar, pois aquela era a coisa mais gay que eu via desde os nossos tempos. Ao menos eu fizera coisas de macho, ao menos eu era verdadeiro, ao menos eu não tentava pagar uma imagem de “garoto ideal” na frente das suas amigas e inimigas. Eu era eu, porra, por mais que nossas frescuras fossem grandes. Mas ele me superou. Palmas. E a vontade que tenho é de cagar minhas merdas pela boca. Não coprofilia ou qualquer dessas porcarias cools do novo século, mas uma metáfora simples e lógica para mostrar meu desespero por tamanha viadagem. Sério, eu confiaria nossos segredos mais ridículos a um desconhecido, mas jamais dignificaria seu gato como confiável. Que merda é essa? Soa ridículo, forçado, antinatural e igualmente hilário, diga-se de passagem, porque a minha segunda reação, após a repulsa, foram as gargalhadas. Talvez porque eu estivesse chapado e bêbado, ou nem tanto, já que comprovei a autenticidade da piada quando me percebi rindo da mesma maneira, sóbrio, um dia depois. Faça-me o favor. Agora vejo que prefiro alguns colhões do que toda essa frescura, porque ele até me superou! Ele me superou! Dá pra acreditar?! Não. Eu nem queria, mas é a verdade dos fatos. Só me resta vomitar essa bosta e, claro, oferecer meu pesar. Você já teve coisa melhor. 

9 de outubro de 2013

Respiração



Eu quis senti-la, para aplacar uma ilusória fantasia de que é outra pessoa em minha frente. Daí a ilusão, daí a fantasia. Não é ela, Felipe, nem por dentro, nem por fora, mas parece tanto... Maldita praga. É desprendimento que procuro e o mundo não permite. Aqui sento eu, na vão tentativa de sentir seu perfume. Que idiota. Ela está á frente, a um palmo de distância e nada digo, pois o que almejo é apenas um cheiro, o pairar do aroma em sua pele, dos cabelos negros escorrendo, lisos, pelas costas, fazendo de conta em sua aparência análoga que é outra pessoa, aquela que não me larga – aquela que não posso deixar. Mas eu disse: a tentativa é vã e não consigo seu perfume sentir. Maldição? Azar? Nunca. A apreciação, porém, não tem fim, já que ela ainda está aqui, a um palmo de mim, a um palmo de dizer “oi”, tão perto, tão almejável, tão provável e fácil. Fico aqui, permaneço. Em sua quietude distraída durante a aula – conversando volta e meia com um breve comentário, uma risada singela com o tom de voz agudo, um passeio dos dedos sobre a tela do celular ou um movimento de mão entre os cabelos – seu tórax sobe e desce, tão calmo quanto o arfar de uma lustrosa e imponente Nyctea scandiaca. Sua respiração me aplaca então, afagando a frustração primária do perfume, mergulhando-me na brutal e sádica contemplação silenciosa, carente de oratória e coragem. Mulher análoga, garota parecida, queria eu ser capaz de sentir teu respirar escapando pelas narinas, quente, intenso, tranquilo, aquecendo em mim qualquer parte (uma fibra de pele já me basta), fingindo que sou teu, fingindo que és minha... Fingindo que és ela, em meio ao padrão dos olhos, a cor da pele ou a textura dos negros cabelos. Maldita fixação de lembrete, maldita lembrança, maldita comparação e covardia!
Queria eu sentir teu cheiro.
Queria eu sentir, pelo menos, tua respiração.


8 de outubro de 2013

O ódio é grande



E sem querer, você se tornou exatamente como aquele a quem mais admira: Deus... Não, pera, não! Quis dizer outro personagem, me refiro ao decadente homem perdido e solitário que povoa na ficção as ruas de LA.  Você encontrou nele a explicação para suas próprias perguntas, encontrou nele algo digno do qual se identificar, viu em suas visões distorcidas um conforto para respirar e dizer: “Ei, este sou eu! Ei, finalmente alguém me entende”. E está aí. Você se encontrou, parabéns. Decerto não foi um encontro residido em uma imagem sólida de boa reputação e pensamentos éticos, não. É uma questão absorta do mundo normal, um perfil desgastado, consumido pelo pessimismo e ódio próprio. Transcrevendo as palavras daquela tão promissora, porém ex-namorada: “Bebe demais, escreve de menos e o único exercício que faz é no quarto... Você ama as mulheres, mas se odeia. Assim, qualquer uma que goste de você é vista como tola”. Xeque! Palmas, soem os tambores, fiquem de pé, pois os espetáculo foi concluído. Esse é quem você é. Desgastado. Destruído. Depressivo. Danoso. Mas há amor próprio nesse ódio próprio, porque odiar-se é a forma mais gentil e verdadeira de tratar a si mesmo. Você ama se odiar, e está satisfeito assim, é a sua vida, é seu modo de enxergar o mundo lá fora, tão corroído quanto seus olhos, pois o ódio é grande e acabe perfeitamente na cama e no colchão de amar. Você está satisfeito com isso.
Encontrou-se ligeira e profundamente em Hank Moody - como se soubesse disso desde os sua infância.


6 de outubro de 2013

Um belo filho da puta



Veja só. Eu estava ali, rindo um mar de lágrimas com a história que ele contava. Bradava risadas entre sua eterna sacanagem, gesticulava e berrava com aquele bico que originara seu apelido entre os amigos e a família. E eu me desatava a rir. Sua filha da putagem, latente e conhecida por mim desde criança, era narrada com extremo orgulho. Era mais uma de suas armações, mas, ao que parecia agora, apenas uma consequência de ser tão filho da puta e conquistador. E ele contava a história do lançamento no livro do qual fora convidado, lendo as aventuras descritas pela autora falando sobre um caso forte e carnal de “amor” intenso, ele riu e comprou o livro apenas para que ela autografasse. Aproximou-se da autora (sua conhecida) e olhou para o atual noivo dela. Começou a rir e fazer aquela expressão cínica – que, aliás, é sua expressão natural. E deu o recado no momento do autógrafo, especialmente para a autora e seu noivo escutarem. Então o recado foi dado. Ela riu, envergonhada. O noivo, que já sabia da história recorrente, apenas fechou a cara e ficou irritado como nenhum outro homem poderia ficar. E findada a história, ele continuava a rir aqui na cozinha de casa, eu mais ainda, e todos também. Implicitamente dedicado, a paixão arrebatadora daquele livro era ele. Ele se orgulhava por causa da sua “filha da putagem”, aliás, ele é um exímio artista nessa área. Eu ria, ria e me divertia. Não tinha como não fazê-lo. Filho da puta. Eu amo o meu tio.

23 de setembro de 2013

Manual



Não me foi concedido um manual com este tipo de sobrevivência. As páginas dele, afirmo, me são ainda totalmente estranhas. Não sou apto a amolar esta lâmina para caçar, não sei manobrar o bambu, não aprendi a construir um abrigo; me falta alimento, minha barriga dói tanto quanto meu peito, talvez seja a mesma dor se apoderando de outras áreas. Tenho fome. A fogueira é a pior parte: não há em mim o combustível necessário, não faço a mínima ideia de como mover esta palha ou girar a madeira, atritar, esquentar - eu não sei. É um manual inexistente que me foi dado, e me enrolo nas roupas antigas, procuro abrigo durante à noite, sinto o frio da solidão, a iminência do afastamento. Eu tenho medo, eu choro e não ligo para o que os deuses antigos que me observam pensarão sobre. Sou apenas um menino perdido e inconsolado dentro de mim mesmo, que não sabe sobreviver a este antigo desastre. O que me resta são fotos e sons que retumbam na mente, memórias de uma voz e de uma época antiga. O que me resta é isso, durante uma noite escura e profunda sem estrelas lá em cima, com um milhão de demônios e lobos a me espreitar como próxima refeição. Estou cedendo, pouco a pouco, confesso. Deixarei que eles me consumam, me devorem, estuprem minha dignidade da alma, caráter e orgulho são agora coisas enfadonhas, sem sentido, sem valor, tão perdidas quanto eu por inteiro. Não me foi concedido um manual de sobrevivência. Não sei o que faço, não sei o que ando fazendo – há muito, muito tempo.

17 de setembro de 2013

Chupadores



Eu poderia ser encaixotador, carregador, ajudante de auxiliar. Eu poderia ser qualquer coisa e ainda assim voltaria até aqui”. Recebi um olhar de desprezo, típico de chupadores de merda que adoram parecer superiores, mas que estão na mesma merda que você – ou até pior, ao menos eu uso a porra do meu cérebro. Olharam-me desconfiados, sem sequer entender minhas palavras, digo, não o seu significado superficial, mas o profundo. “E como tu vais ganhar dinheiro?”. Isso é um emprego! Não entra na cabeça de ninguém? Quis responder algo mais baixo, quis até responder isso, mas não coube ao meu cansaço, eu estava fraco demais para discutir a mesma conversa depois de tantos anos repetindo, repetindo e repetindo. Por isso retruquei “é um emprego, têm-se um contrato, ganha-se por isso. Você trabalha diariamente, cumpre um prazo e entrega o material”. É tão difícil assim entender? Só estou tornando meu ofício de sempre um “ofício oficial”. De um jeito ou de outro, os chupadores de merda continuaram com aquele olhar de superioridade, dando palpites sobre a parte da minha vida que eles nem sequer tinham se esforçado a chegar. Deixem-me. Eis a minha profissão, só estou agindo conforme aquele ideal que vocês tanto adoram dizer com frescura e idealização: siga seus sonhos. Eu estou seguindo os meus, ou tentando, não estou parando, apesar de todo o pessimismo. “Ao final do dia, eu ainda sento aqui e escrevo alguma coisa, jogo diante do mundo ou engaveto para o futuro, estou fazendo a minha parte, e vocês, chupadores de merda”? Eu quis tanto dizer isso, mas balancei os ombros e deixei que se fodessem com suas certezas falhas e cheias de críticas. Não fazem nada além de um blá blá blá longo e interminável, perdem suas vidas com palavras inúteis, perdem-se no tempo, em seus quartos, nas janelas observando os vizinhos e julgando-se superiores. Pois bem. Então irei trabalhar com o que gosto de fazer, e um dia, quem sabe, eu até escreva um livro cheio de merdas filosóficas, porém profundamente coerentes. E aí vou querer vê-los chupando pelo menos isso. Vão continuar falando, mas aí eu já estarei lá, e vocês... É, vocês continuarão onde estão. Chupando, chupando e chupando... Sempre as mesmas bostas.

10 de setembro de 2013

A menina era de Deus



Pairava ali algo inegável, uma oportunidade boa e saudável do envolvimento iminente. Ela tinha um olhar intenso, vivo de simplicidade e beleza, tão profundo e superficialmente enigmático. Era uma piscina dúbia de atração e tranquilidade, ah, aqueles olhos. Mas a menina era de Deus. Emanava Deus na maioria das palavras, embora mostrasse o mesmo respeito que um homem profundamente sábio entre as farpas de dois extremistas. Sim. Ela exalava Deus e respeito, mas, ainda assim, o pertencia de corpo e alma – e mente, diga-se de passagem. Eis o entrave secular para este tão mísero bobo que a admirava: no menino havia a contestação dos cientistas e o humor dos kamikazes. Perca o amigo, mas jamais perca a piada. Deus era piada, Jesus era piada, religião era piada. Ele emanava piadas do mesmo modo que ela, respeitosamente, emanava o ser divino venerado pelos mais bob... Pelos mais devotos, quero dizer. Entrave histórico, entrave filosófico... Entrave de caráter. Ele não jogaria fora a própria descrença para se dobrar diante de alguém tão santo com excesso de crença. Orgulho? Talvez. Residia mais no respeito por ela. No fim, talvez não quisesse se envolver para não magoá-la com suas piadinhas infames e banhadas de blasfêmia. É, talvez nem fosse pelo orgulho e temor de se corromper à fé, mas sim ao sacrifício de não magoá-la, ao sacrifício de não ofender o que ela acreditava. Essa era sua forma de respeito, essa era sua forma – quem sabe deturpada – de caráter. Como um homem santo que joga fora sua própria vida em nome daqueles que tanto o julgariam, ele até aprendia lentamente com isso a venerar o rei dos Judeus, que em seus dias vindouros pôs o próprio cu na reta pelos pecadores que o depreciavam. Sacrificava a própria – provável – felicidade para não machuca-la com trocadilhos secos e inteligentes.
Tão lindo, tão belo, tão divino - pena que a menina era de Deus.


9 de setembro de 2013

Queria foder



Ele pegou um cigarro do bolso e acendeu. Abriu a lata de cerveja e bebeu. Sentou-se em um banco qualquer, num lugar da cidade qualquer que tivesse árvores e ar mais sereno. Fumou e bebeu. Ele queria outras coisas, queria sair dali, estar em outro lugar e em outra vida, bebendo outro tipo de bebida e não fumando. Mas era a realidade. Não usava aquelas porcarias por rebeldia ou para representar o quão derrotado estava. Há um momento na vida que você apenas se sente compelido a realizar tais atividades, e vinha sendo seu eterno momento há anos. Uma mulher, com sua boceta amável e sorriso nos lábios pode, de todas as maneiras, foder com o cara do jeito mais cruel que se possa imaginar. Homens também o fazem com seu palavreado e paus sedentos por gozo. Seres humanos fazem isso frequentemente, sejam homens ou mulheres. E ele pensava exatamente isso: não há estatísticas sobre quem é mais ou menos infiel, devasso ou mentiroso. Eram todos os mesmos. Sempre há um predador e uma presa. Ou predadora e presa. Então ele bebia e fumava. Faltava foder, mas o salário tinha terminado e o auxilio bancário da tia também. Sim, ele até poderia foder, mas estava sem grana para procurar sua garota preferida – ela o amava como qualquer outra, por um bom preço, ele recebia todo o amor do mundo por uma noite inteira. Mas estava sem grana, então fumava e bebia. Estava fodido, pensando em outra vida, outro sonho, um nome diferente. Cogitava as chances de comprar uma arma com o próximo salário, cogitava finalmente ter coragem para finalizar o plano – era só um plano, é, um bem distante, como um plano D, caso as coisas viessem a dar tão errado. Por isso ele fumou e bebeu. Terminou a latinha em menos de seis minutos, já era a terceira ou quarta... Não, talvez a quinta, que se foda. As coisas andavam ruins, independente do número de álcool no sangue. Amassou a bituca no banco e jogou na lixeira ao lado. Tirou outro cigarro do bolso. Havia gastado os últimos trocados nas latinhas e na carteira. Bebeu. Fumou. Queria foder, mas simplesmente foder não aliviava o que realmente o atormentava. As coisas geralmente são assim.
Bebeu. Fumou.

8 de setembro de 2013

Além



Ele queria desistir. Diziam pra ele desistir. “Isso aí não vale de porra nenhuma” ele ouvia a cada desafio e se sentia ofendido. Mas isso só lhe dava mais força. A cada queda, usava o próprio chão pra se reerguer. Seu pai dizia “calma... depois piora”, “pior é na guerra... ainda tem bala” mas as ironias paternas já não faziam mais efeito sobre sua cabeça. Já não era mais aquele garoto que tinha saído de sua cidade. Não que já fosse um homem feito, mas já tinha amadurecido muito em todos os aspectos.
A vida já cobrou alguma coisa dele, menos do que ela cobrou de muita gente, ele sabia. Mas não tinha com quem compartilhar a sua dor. Nunca teve. Nunca quis ter. Como dizia a letra daquele RAP que gosta tanto: “Desde pivete tenho amigos, mas me sinto sozinho/ meus problemas são meus, vou resolver sozinho” ou do outro que tanto ouve “colegas, eu tenho vinte; amigos eu tenho seis; que vejo sempre, só quatro; que posso contar, só três”. Não tinha mais nenhum. Não desmerecendo os que o acompanhavam. Jamais. Porém tem muita coisa que eles não fazem ideia que acontece, que ele pensa, deseja, desiste de.
Ele só quer que seu próximo sonho se realize, quer novas ares, novas pessoas, momentos. Não cria esperanças, mas expectativas. Se forem superadas, bom; se não, tenta-se até sentir-se bem, mas nunca satisfeito. Ele não busca fama, dinheiro... mulheres talvez... Ele só que o seu El Dorado, seu Graal, seu além do horizonte.

(T.S. Banha)

Você e o seu texto e o quão desgraçado você é



Fodido - juro por Deus que é a mais pura verdade e que as explicações me são necessárias tal como o ar que respiramos. Eu me achar o popular e melhor de todos? Não. Chamar a mim mesmo de lindo? É ironia, e farei questão de deixar claro. Há coisas que preciso explicar, coisas das quais não sou capaz de fazer e necessito acrescentar palavras como “se eu tivesse”, “se eu pudesse”, “se eu fizesse”, “se eu fosse”. Sempre um “se”, pois é ele o senhor da minha vida, bem como Deus é tudo na vida de um cristão – ao menos teoricamente. Não, eu não estou brincando quando me ridicularizo na frente dos outros; não são caprichos as piadas sobre meu fracasso; não é psicologia reversa quando ironizo o fato de eu ser incapaz. Eu sou, ponto final. “Quanto menos se acreditava na vida, menos se tinha a perder”, algum velho safado e divino escreveu isso certa vez, e quando li, há muito havia adotado tal estilo de vida.  Fiquei feliz por pensar igual a um humano moribundo já morto, porém que muitos idolatram e veneram através das páginas de suas obras. Fico feliz, a cada linha, por notar que penso igual ao solitário filósofo Fulano ou ao decadente escritor Ciclano. Faz bem. Significa que aonde quer que eu vá quando morrer, residirei ao lado desses vagabundos apreciadores da boa poesia, do ócio e da desgraça – a espiritual, a mental e a passional. Talvez seja a única vez em que fico verdadeiramente em paz e feliz, pois sei que no fundo não estarei sozinho. Que esse dia chegue – logo! –, já que, por enquanto, eu vou levando assim: sendo humilde, maldito e fodido, cuspindo blasfêmias contra Deus (o mesmo pelo qual jurei no início), minha própria pessoa e à hipocrisia que nos cerca.
Pois a vida não passa de uma grande ironia. E da minha, ha ha ha, só faço rir.


5 de setembro de 2013

Ficticium



Há duas escolhas: posso seguir em frente ou simplesmente parar. As duas me soam tentadoras, mas a primeira é sempre um estilo de vida. Há quem diga que meu mistério nem mistério é, a não ser o gosto pelo sofrimento e pela dor; há quem diga que tornou-se meu ideal, meu motor básico para tal combustão diária. E sendo estas palavras essencialmente metalinguísticas, ponho-me a pensar: “o que será dos 16, quando já imagino os 45?”. O que será de um futuro próximo, quando já vivo o futuro distante? E faço um milhão de perguntas ao meu senso mais racional, aquele que mora em um lugar profundo e distante desse meu “eu” babaca que vos interage diariamente. É hora de parar? Vale tanto a pena? Pergunto-me isso há tanto tempo sem nunca ter chegado a uma resposta, que agora sei que quem deve construir a solução sou eu. Mas, ora, é apenas uma vida literária e fictícia, que mal há de fazer à minha reputação? Trata-se apenas de um alter ego inegavelmente destruído. Igualmente destruído. Mas será essa destruição verdadeira? Será a exposição necessária? Eu deveria parar e assumir novas perspectivas? Há tempos ando me questionando, e presumo que por tempos assim continuarei. É como dizem: os questionamentos movem o mundo.

24 de agosto de 2013

Hobbie



Faço isso pela paixão, não pelo sucesso. Faço isso pela paz, não pelo público. Faço isso pela calmaria de uma pós-tempestade que me é o interno da cabeça, dos pensamentos e do peito mastigado. Faço isso pelo simples dom do hobbie, se é que dom e hobbie podem se unir. Se sim, aqui estamos, juntos, entrelaçados como num promíscuo sexo entre vira-latas. A princípio poderia eu ter enveredado por caminhos distintos, mas o senso da razão para agir perante a emoção sempre falou mais. Aliás, poucos foram os textos em que dediquei minha razão. Nunca o fiz para ganhar garotas, nunca o fiz para conquistar vaginas e estampá-las aos amigos como troféus. Porque isso não se faz, não um homem de verdade, tendo ele 10, 19 ou 80 anos. Fiz pelo gosto da escrita, sem profundamente almejar públicos ou fãs. Eu poderia ter tudo isso, caso quisesse. Poderia ter a maioria das mulheres, caso minha alto-estima fosse como a de uma pessoa comum. Mas, outra vez, não o fiz. Não sou otimista, não amo a mim mesmo para me sentir confiante. Mil delas não me satisfazem como apenas uma – ela – me satisfaz, então para quê esse falso determinismo de somente tecer palavras para conquista corações alheios e inocentes? Não. Eu nunca fiz por segundas intenções. Fiz pelo hobbie, sempre por ele. É aí que sempre residiu o problema: falta de ambição, pouca ganância e poucos resultados. Mas não se pode ter tudo, pequeno gafanhoto.
É a conquista ou a paz – e estou verdadeira e inocentemente bem com o segundo, obrigado.  


16 de agosto de 2013

Conrado, meu amigo



Mudou, e lá vamos nós de novo, mergulhando nesse infinito buraco de espirais conflituosas. Meu ânimo é jogado lá embaixo – ânimo esse que nunca foi lá essas coisas. Talvez a depressão esteja entranhada nos meus genes, talvez, creio eu, tenha se tornado um estado patológico cujo qual nunca quis admitir. Aí está. Depressão da revolta, não da tristeza, se é que isso existe. Aqui estou afundando de novo, aqui estou eu vendo meus planos se esfarelarem por causa de uma errônea decisão que tomei há exatos dois anos. Não. Talvez tenham sido três ou mais. A merda inteira está no fato de que quando coloco algo na cabeça, tenho de cumprir. E cumpro, mesmo com toda a falta de perseverança, pasmem vocês. O problema é que uma única decisão errada vem tendo suas consequências até hoje. Um bastardo talvez tenha contribuído para isso também, mas bastardos não têm culpa por serem bastardos e ele até pode receber o meu amor - talvez. Mas estou divagando. O fato é este: minha vida é uma eterna propagação de merdas. E cá está a minha, uma situação que não pode ser reparada vindo para foder com toda uma meta que consegui arrumar neste ano. Pode ser a simples troca de um turno, mas vai arruinar tudo – assim como a insatisfação com um único curso me fez criar um clima ruim e intolerante a respeito de toda uma Universidade Federal inteira. Jurei que não falaria mais disso, porque, até então, as metas e os planos estavam perfeitamente direcionados e montados. Mas a vida é imprevisivelmente sacana, certo? Então vem um pequeno detalhe e caga uma diarreia gigantesca em mim. Tentei, no último um ano e meio, retirar todo o aprendizado de escolhas erradas, e consegui. Como sempre, por mais reclamão que eu seja, deixo as merdas que ocorreram de lado e filtro somente a experiência que aquilo me trará e de que forma me fará amadurecer. Mas estou levando tapinhas demais desse destino, dessa vida ou desse acaso. Cansa. Não vejo mais sentido, por que isso acontece comigo, caralho? Devo ter sido um nazista pedófilo na vida passada – realmente creio nisso, então é o karma ruim acumulado nessa nova forma de vida que vos fala. É trágico. É deprimente como dou tanta importância aos detalhes, pois são eles que fazem a diferença, e neles que me preocupo. A troca de um turno foi um detalhe, mas para mim... Para mim parece mais, por isso muda tudo.
Bem-vindo a uma nova merda, seu fodido.

15 de agosto de 2013

Para as Damas



Ela me perguntou o porquê, fiquei sem resposta. Já havia oferecido meus argumentos por completo, e como todos os outros – e todas as outras, sobretudo -, julgou-me um bobalhão com um sério problema de baixa auto estima. Porém não saiu do meu lado. Continuou com as perguntas, sobre minhas faltas, minhas ausências, meus sumiços. Aí estava uma coisa da qual eu nunca fugia e também nunca mudava: os sumiços. Que sintam minha falta, ótimo, mas que extraiam disso a maior lição de todas ao aprenderem viver sem mim. Sei que é fácil. Aliás, sei que será extremamente fácil para vocês quando um digno ou indigno rapaz lhes aparecer, jogar o jogo da conquista e lhes pedir em namoro – coisa que nunca faço, nunca vou além... saibam: nunca irei. Quando seus corações estiverem sendo invadidos por novos cavaleiros, e seus status de Facebook se modificando para “em relacionamento sério com O Rapaz Promissor que Me Trouxe Flores no Dia da Conquista e Me Disse Palavras Bonitinhas”, esquecerão de mim. O por quê? Simples: eu fui apenas um amor de internet, apenas o garoto fofinho daquele blog, que é amável, porém odeia a si mesmo – e tem mil razões para tal. Não, antes que deduzam que escrevo este texto com revolta, estão enganadas. Sinto-me feliz quando cada uma encontra um novo rapaz e se apaixona, mergulhando em um relacionamento de verdade, sólido, concreto, vivo, com beijos de verdade e acolhimentos de verdade. Fico feliz por vocês, porque só assim parecem esquecer minha infeliz sombra que outrora tanto as atormentou. Falo no plural, porque refiro-me aqui não somente ao meu amor, mas também àquelas meninas que tanto se encantaram por mim, mas que apenas receberam respostas evasivas e adiamentos de encontros. Falo para todas, embora tenham sido poucas, creio eu. É bom que conheçam o verdadeiro envolvimento de uma relação e esqueçam a minha pessoa, eu não valho a pena, digo isso sempre no início – antes, durante e depois. Aviso dado. E mesmo assim, não me impede de sentir a culpa. Até que então surge um rapaz de verdade e as leva para longe para respirar novas brisas, novas experiências. Como volta e meia vos digo neste blog, nunca estiveram de fato apaixonadas por mim, mas sim por quem pensam que sou; estão – neste atual caso, estiveram – apaixonadas pelas minhas palavras, pelos bons e certinhos textos, pela infame arte de denegrir a mim mesmo.
Então aqui está sua resposta. Faltarei aos encontros, adiarei uma visita. Porque a quero longe de mim. Quero que se mantenha distante para encontrar algo melhor e mais vívido. Não valho a pena, nunca valerei, porque para meu custo ser elevado a alguém, ele terá de ser elevado primeiramente a mim, e isso é pouco provável de acontecer. Portanto, não questione, minha linda. Teremos uma aventura de uma noite, a aventura de uma semana, serei inteiramente seu, mas recuarei. Não por medo de me relacionar, mas por simplesmente ser impróprio e inútil para isso. Encontre na minha falta um alguém melhor que pouco a pouco a fará esquecer de mim.
É isso o que importa, e seja feliz. Sejam todas igualmente felizes.