10 de julho de 2017

Igreja em ruínas



Eu peregrinei por estas peles tão devotamente por dias e noites, Luas inteiras a louvar Nomes pagãos. Eu fiz oração, eu ajoelhei e me embrenhei por matas selvagens, propositalmente descuidadas de atenção porque meus Deuses Egoístas não se importam com os pormenores dos ritos tanto quanto eu não me importava com os pormenores dos ritos. Havia fé demais encarnada nas necessidades e nos fervores dos gritos. Houve noites de sacrifícios, houve dias de penitência. Da fúria de meus Deuses Insanos eu bebi o rum mais cruel, o vinho profano. Abri lápides e reneguei passado, certezas e crenças antigas – admiti-me covarde para venerar meus Deuses Novos, admiti-me culpado, admiti-me leviano de suas vontades, de seus desígnios. Tão louco e perdido, ouvi suas vozes e seus chamados, fiz de meu corpo instrumento para adorar e do meu peito altar para entoações de vis melodias. Pelas matas selvagens eu dediquei meu sangue, meu nome e minha vida; pelas matas selvagens esfreguei meu rosto, passeei a língua, fiz de seu gosto bússola, aroma devoto, único e supremo. Inviolável. No entanto fui eu batizado: moído, sacramentado, sujo, sacrificado. Fui torpe e cego, xiita eufórico das causas mais banais, odiei homens, mulheres e cuspi naqueles menores que eu, fosse em vida, fosse em brilho. De homens animalescos com selvageria tirei sangue, gritei e tremi, bebi da mais pura adrenalina para defender meus Deuses, meus Deuses Egoístas, intensos, cheios de si, cheios da verdade e cheios da certeza, da Palavra certa e nunca não-dita, da Palavra nunca incontestável, da palavra nociva nunca torta, nunca equivocada.  Caminhei eu em solos cinzentos, entre mortos-vivos que fui condenado a lembrar, pelos quais fui obrigado a esfolar e a esfolar-me. Beijei meus Deuses Egoístas, suguei-lhes os lábios, a boca e fiz de sua língua minha hóstia fervorosa, comunguei com suas curvas, comunguei com seu sangue mensal e de seu perfume fiz meu ópio. Comunguei corpo, alma e suor, comunguei a alma que eu nunca tivera e perdi a bondade nata do vão ateu que era. Venerei os pés de meus Deuses Egoístas, neguei minha imagem, neguei minha bondade, neguei minh’alma e neguei minha opinião, fechei a boca para gritar canções que já não eram minhas, para recitar preces que eu não acreditava com o peito que já não a mim pertenciam. Eu amei Deuses Egoístas que nunca me escutaram, que nunca responderam ou que nunca foram gratos, eu amei Deuses Egoístas com minha fé indomável e odiei Deuses Egoístas por não responderem e entregarem a mim a sina de velhos cegos como Tirésias e penitentes como Édipo caído. Eu amei Deuses Egoístas like a miner loves gold and this will never grow old, um dia julguei por verdade absoluta. Eu venerei Deuses Egoístas que me responderam tanto quanto responderam a fétidos ateus de más intenções, banhados em drogas diabólicas das narinas e mentes opulentas. Eu entreguei a prata, fiz-me diamante, usei nos ritos o fogo e neles bebi o mel. Eu matei por Deuses Egoístas que tocaram-me a pele, balbuciaram-me nos ouvidos palavras de fel e masturbaram-me de luxo com promessas vãs de eternidade.
Eu venerei Deuses Mentirosos,
Amei meus Deuses Egoístas,
Danosos,
e agora
faço preces malditas
loucas, assassinas
de minha fé destruída.


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