“Eu
é que nunca mais piso aí”, ele pensou.
Passou por debaixo daquele túnel de
imensas e centenárias mangueiras com os pingos de chuva precipitando-se sobre
telhados, galhos, numerosas folhas e seus próprios ombros. Foi aí que parou,
absorto por memórias agora distantes dele por tantos anos que quase haviam se
tornado pó no depósito de sua mente - quase.
Alguém passou por ele com pressa, tentando fugir da chuva que se anunciava
logo após o calor de mil graus que fizera na cidade, e agora, com o vento forte
e o céu escuro, a avenida inteira se agasalhava como um cachorro amedrontado. Menos ele, ele não, ele ficou ali. Parado,
quieto, com punhos cerrados e relembrando um par de olhos verdes que deixou
escapar e um abraço ou outro que deveria ter se arriscado com mais coragem.
Sabia, no entanto, que era quase sádico cobrar de um menino as atitudes de um
homem, bem como todas as respostas que hoje tinha e que há tantos anos o
faltavam. “Lugarzinho miserável de
pessoas miseráveis, todos uns cagões, eu não ponho meus pés aí nunca mais”.
Então um trovão estremeceu o céu e apressou os pingos de chuva, ele puxou um
papel do bolso e encarou uma lista com seis itens – com exceção do último, todos
estavam riscados.
Documentação do caralho.
Respirou fundo e atravessou a
avenida. Malditos fossem todos os deuses e condutores do destino, ele
praguejou, e antes que a chuva caísse, entrou no prédio verde – nem todo dia
conseguia manter as próprias promessas.