Tudo.
Ele tinha tudo. Não materialmente
falando. Não tudo o que queria. Não tudo o que precisava. Tudo que merecia.
Coisas boas e ruins. Evitava reclamar ao máximo, pois sabia que tinham pessoas
que não tinham as coisas boas que ele tinha e que tinham pessoas que tinham
coisas ruins bem piores das que ele julgava ruim. Um bom emprego, uma família
que o apoiava, um curso que lhe realizava. Não tinha mais uma mulher que o
amasse. Foi estúpido o suficiente para perdê-la. Lamentava? Não. Fazia mais
falta a amiga que ele perdeu junto com ela. Ainda faz. Mas ele tinha tudo, só
que o seu tudo não era suficiente para fazê-lo feliz. Queria mais. Muito mais,
porque sabia que o mundo tinha esse ‘muito’ para oferecer. O quê era esse
muito? Se soubesse já tinha ido atrás pra conseguir, mesmo que sem esperanças
de obter. Então ele corre atrás de várias coisas, esperando, torcendo,
implorando ao seu Deus independente de uma religião que umas delas fosse a que
ele tanto buscava – em vão por enquanto. Entregava-se às atividades mais
diversas imagináveis. Sentia saudade de seu vídeo-game, que já havia sido
testemunha de alguns dos seu dias mais tristes e sem sentido. Tentar voltar a
ser criança, para tentar fazer sumir os problemas que não lhe importavam nessa
época. O mundo ultimamente vinha exigindo muito dele. Não mais do que ele podia
suportar, contudo, mais do que ele esperava. Sentia falta das coisas simples.
Conversar à mesa da cozinha sábado à noite. Vinho nas taças, Cartola tocando.
Uma realidade cada vez mais distante e esporádica, realizável em situações
obtidas através de um malabarismo insano e milimetricamente calculado, de forma
a comprometer menos possível sua rotina maquinal, mas que o agradava. O próximo
passo? Não fazia ideia. Não fazia questão. Só queria se sentir minimamente
preparado. Impossível, sabia disso. Mas não tinha medo nem esperanças. Só
grandes planos. Iria esperar que tudo acontecesse de forma natural, seguindo o
curso natural das coisas. Não havia motivos para ansiedade, afinal, ainda
conseguia se convencer de que tinha tudo e de que aquele todo era o necessário.
(T.
S. Banha)
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