22 de outubro de 2025

noxius





A característica de ser nocivo, nestes termos e nestas específicas circunstâncias, parece-me quase, quase congênita. É como o semear de uma semente ou a iminência do passado, que bate à porta todas as noites de sábado, ultimamente sempre aos sábados. Porém não é característica hematológica, não está correndo nestas veias como uma sina latente ou como um determinismo grego, é construção, tijolo sobre tijolo, ato sobre ato, vilipendiados todos através dos anos, cravados nesta demora de crescer, nesta demora de enxergar, a mesma demora com que o carboidrato corrói as córneas, retinas e todos os demais órgãos que te fazem não enxergar, que te fazem não ver, que te fazem abrir apenas o par de primeiras pálpebras, jamais o segundo.

É a permanência desse ar nocivo, desse ar atrasado, dessa demora de ver o tempo passar por estares preso ao presente, por não sonhares ou por não planejares. Por que o presente é confortável? Por que não percebeste a areia na ampulheta escorrer? Ou por que não notas quando esse teor nocivo te enche a boca, desliza pela língua e doma as ações? Ou as desações. O quê, diga-me, o que exatamente te faz assim? A criação? A memória de nunca ter pertencido ou estado em uma época boa da vida, por que em todas as épocas ou te arrependes ou tens vergonha do que foste? A criança mimada, tola, mal-criada por criação que não te cabia julgar ou perceber? A adolescência rebelde, igualmente tola e mal-criada, egoísta-sempre-egoísta e habitante de uma dor que nem deveria ser chamada de dor, tudo porque era uma dor patética e desprezível? Ou o início da fase adulta, uma soma cumulativa-destrutiva das duas primeiras, nociva sobretudo nas palavras e nos atos e na capacidade de expirar veneno & brasa & fuligem & hipocrisia? Ou foram os falsos privilégios sobre os quais a semente germinou, cresceu e agora precisa ser podada ao menos para não se enraizar em paredes e em estruturas de casas alheias? Em qual destes momentos a tua nocividade não proposital, mas igualmente demolidora, vai se apaziguar, desaparecer e dar origem a uma nova pessoa, àquela que precisam que sejas, àquela que anseiam que exista, àquela que parece ser a única, a única a não causar sempre&sempre tanto estrago, lágrimas e corrosão de sonhares?

 

Inclusive, ora, este próprio questionamento é fruto e será o semear de mais uma dessas tragédias.

 

Em que momento estas veias corrosivas,

arenosas &

venenosas deixarão de te assolar, correr por ti &

finalmente

te abandonar?

Até quando?