Veja, o
silêncio sempre foi constante. Algo do qual escritores e fumantes partilham
muito bem: estes momentos de silêncio em que não há ninguém por perto.
O fumante
clama por um espaço, afasta-se de todos, respeita aqueles que estão em volta.
Distancia-se, fala de longe, quer espaço para si. Está sempre sozinho, ele e os
pensamentos, os demônios queimando como um dragão ocidental, não o velho sábio
chinês, mas o velho dragão europeu cheio de cobiça e de significados
pejorativos, símbolo daquilo que Freud combateria.
O escritor
partilha da solidão: precisa estar sozinho. Não veja como um ato sagrado de
iluminação profunda, não. Veja como um ato de concentração. Graciliano Ramos
comparou o ato ao das lavadeiras de Alagoas à beira do rio. Há muito tempo,
durante uma aula, comparei o ato ao da retirada do açaí. O silêncio pode
estar durante, mas é a concentração quem triunfa. A dedicação. O aqui e o
agora.
Na verdade,
para o escritor, o silêncio vem depois: essa ausência de testemunhas da qual
tanto estou quase farto de
testemunhar.
Ele
trabalha o texto. Dele são exigidos concentração, técnica, habilidade e afinco,
demasiado afinco. Depois, vai ao mundo. Espalha a palavra como um evangelista
fracassado. É aí que vem o silêncio: o silêncio da não resposta, do desleixo,
do desprezo.
Conte uma
piada, todos rirão.
Autodeprecie-se,
todos se divertirão.
Escreva,
todos calarão.
Poucos se
importam, poucos ligam. Imagine o absurdo de com aquelas palavras fazer
profissão, sustento? Absurdo! Absurdo! É maluquice. Pois ler exige tempo,
atenção e dedicação. Tempo? Poucos têm. Atenção? Pouquíssimos de nós.
Dedicação? Apenas os apaixonados.
E paixão é
coisa rara.
Paixão é
coisa para fumantes
Paixão é
coisa para aqueles que desfrutam do silêncio e dele vivem.
Paixão é
para aqueles que tudo o que recebem em troca não são palavras amigas ou
reconhecimento, mas a ausência de tais deleites, a ausência de olhares, a
ausência de respostas.
Paixão é
para poucos.
E o
silêncio é para os azarados.