1 de dezembro de 2025

Um conto belenense


 


Paulo Victor Gomes Feitosa nasceu a 27 de abril de 1989. Taurino, com ascendente em Libra e Lua em Aquário, era pardo, tinha 1,79m de altura e, à altura desta narrativa, 83 kg. Torcia para o Paysandu Sport Club (o que, de certa maneira, afirmarão alguns, justificará suas futuras ações e o teor de sua viril índole) e nunca saiu do Estado do Pará – a propósito, e por curiosidade, o mais longe que pôs os pés da cidade natal foi em Marabá, durante tenra infância, para o velório do avô paterno. PV, como era conhecido pelo círculo mais próximo de amigos, de colegas de trabalho, de ex-companheiros de escola e pelas 5 ex-namoradas, era detentor de muitos detalhes e de quase infinitas particularidades, assim como qualquer pessoa neste mundo. Aliás, quando refletia sobre o assunto (do quanto as pessoas são uma miríade infinita de particularidades), um verso específico de Raul Seixas vinha-lhe em mente: cada um de nós é um universo. 

Por questão de coincidentes curiosidades que nada contribuirão à narrativa, o universo-Paulo-Victor quase foi registrado como Ernesto Gomes Feitosa, porém foi o pai quem decidiu pelo nome do filho no instante de registro no cartório Condurú da Avenida Almirante Barroso, a contragosto da mãe, que estava em casa julgando que o marido obedeceria aos desejos e planejamentos dela; em homenagem ao homônimo goleiro “Paulo Victor” Barbosa de Carvalho, que jogou no Fluminense entre as décadas de 1980 e 1990, tricampeão pelo tricolor nos anos de 83, 84 e 85, e que também nasceu em Belém do Pará, assim o quase-universo-Ernesto foi batizado de Paulo Victor. Ser amante de futebol, da mesma forma que o pai, faz de PV um sujeito ímpar, igualmente ímpar como a maioria dos 98,5 milhões de cidadãos ímpares do gênero masculino a atualmente habitarem o Brasil.

Todos esses são detalhes que poucos conhecem. Deles, os mais importantes são de conhecimento de instituições governamentais. Outros, apenas de familiares. A parte mais pessoal deles, compartilhados entre o círculo mais próximo de amigos, de colegas de trabalho, de ex-companheiros de escola e de 5 ex-namoradas. A atual namorada, Maria Clara, era, atualmente, a que mais deveria conhecer PV em detalhes. Deveria. Porque na prática, bem, na prática esta narrativa sequer é sobre Paulo Victor ou sobre Maria Clara, mas sobre a garota que mais empenhadamente conhece Paulo Victor nesta cidade: Mia Gurjão, melhor amiga de Maria Clara. 

O interessante em círculos de amizades na cidade das mangueiras é que nenhum detalhe passa despercebido de ouvidos e de bocas alheias. As intimidades, as brigas, os desentendimentos e as rotinas de um casal, quando não expostas publicamente em redes sociais, são amplamente difundidas entre amigos. Mia Gurjão, por exemplo, conhecia todos os defeitos de PV, pois era ela a quem Maria Clara desabafava quando estava irada, frustrada ou puta. Não são as mães, as irmãs, as amantes, as terapeutas ou as entidades protetoras de um homem a melhor conhecê-lo. São as melhores amigas de suas companheiras. 

Aos ouvidos de Mia Gurjão chegavam os desafogos, as denúncias, as desavenças e toda a sorte de coisas que irritavam Maria Clara, ímpar moça de frequentes vestidos floridos, sandalinhas rasteiras e pele de alvo porcelanato, profusa amante de pagodes em fins de semana e que se deparara com a sorte de namorar sujeitos ímpares como PV. O mais curioso, entretanto, é que, por conta das inúmeras confissões, a melhor amiga conhecia apenas uma versão de Paulo Victor, versão essa que era compartilhada com as demais amigas em comum das moças, geralmente no grupo particular de Whatsapp (PLLP, sigla interna para “Pretty Little Liars Paraenses”), e que sempre retorciam os bicos, digitavam indiretas secretas pelo Bluebird.com ou fingiam simpatia com majestosa teatralidade quando estavam perto do rapaz. 

Mia Gurjão, aliás, era o último tipo.

Um dia, no entanto, as coisas mudaram. Foi em uma mesa de bar enquanto confraternizavam a progressão de carreira de Maria Clara na empresa de advocacia do tio. Ela e PV não andavam brigando por aqueles tempos, pelo contrário. Após 4 doses de caipirinha, a moça narrou o último final de semana do casal em Marudá. Contou-lhes todas as peripécias sexuais com a mais sórdida profundeza de detalhes. Porém, mais que isso, tocou num assunto que nunca havia antes tocado, a respeito dos 16cm perfeitamente retos e idealmente espessos de Paulo Victor, e sobre como ele era um homem mais do que higiênico, veiúdo, cheiroso e entalhado como se por um Bernini no mais artístico dos mármores, sobretudo quando rijo, só que não branco, mas moreno, a quase cor do pecado que brilhava, lustrosa, quando babado pela saliva dela.

Revelou a todas as meninas que ele era detentor do segredo que parecia intocável e pouco sabido pela maioria dos homens: sobre como o vai e vem, o entra e sai e o tira e põe não é o truque-principal, não o carro-chefe, tampouco o único movimento a ser feito, mas sim o gingado lateral, o mover horizontal de quadril quando os 16cm já estavam dentro dela, a leve reboladinha que PV sempre fora expert em dar. Muito além disso, revelou, sem perceber, o formato da língua do parceiro, a forma como a ponta era anatomicamente projetada para proporcioná-la prazer e como possuía um movimento específico capaz de alcançar o ponto no corpo feminino que a maioria dos homens só parecia descobrir a existência depois dos 25 anos de idade ou da 101ª transa, quando descobria. Narrou-lhes também a forma como Paulo Victor introduzia nela os dedos médio e anelar da mão direita, enquanto acariciava-lhe o ponto desconhecido pela cultura masculina, ou quando, extremamente molhada e já dilatada, ele conseguia também introduzir o dedo indicador como complemento. Não só isso, como ele também movimentava os dedos em forma de gancho, tocando-lhe a parede interior do órgão e pouco custando fazê-la explodir e esguichar e todos os demais verbos sensoriais começados com a letra E de extrema eclosão de enérgica euforia. 

Naquela noite, as garotas beberam um pouco mais e se divertiram mais ainda. Reclamaram sobre a vida e praguejaram os ex-namorados que agora estavam casados levando vidas melhores, com empregos melhores e em casas melhores, porém com mulheres “feias” e “gordas” que sequer eram merecedoras de comparações como “mais feias que a gente”. Apesar da fama já recorrente entre as amigas, e como todas as garotas já conheciam PV, algo substancialmente diferente ocorreu naquela mesa de bar. Entre todas elas, sim, mas principalmente com Mia Gurjão que, sem se dar conta – levada pela sutil semente que é plantada nos confins das intenções, na sombria área da psique a quem os especialistas chamam de desejo latente –, lançou mais duas ou três perguntas a respeito do desempenho de PV. O restante das meninas também teria notado, e muito teriam reclamado ou a criticado, caso não estivessem igualmente interessadas nas respostas. 

Incomodada, mas sem saber o porquê, Maria Clara respondeu às perguntas. Só se deu conta do problema causado naquela noite meses depois, quando a paranoia já havia alimentado desconfianças e as mesmas desconfianças trouxeram evidências:

os comentários de Mia Gurjão nas fotos de PV no Instagram, 

o número de curtidas que ela começou a dar nos stories dele;

a frequência com que Mia exigia mais encontros entre amigos,

churrascos,

rolês num Açaí Biruta,

BalacoolBar,

Vitrine Lounge, 

Manga Jambú,

resenhas em bares durante qualquer RExPA

ou a maneira como, ante quaisquer reclamações sobre PV feitas por Maria Clara, Mia fazia questão de soltar um “meu casal favorito” em tom falsamente irônico, sugerindo o término como saída viável.

Curiosamente, Mia Gurjão criou mais afeto pelo Paysandu Sport Club e até sobre a história do time começou a perguntar para PV, na frente da amiga, com um tom levemente inocente de quem está genuinamente em busca de aprendizado profundo. Certa vez, até pediu a ajuda de Maria Clara num assunto jurídico e, mesmo sabendo que ela estava assistindo a uma pelada de Paulo Victor com os amigos, fez questão de ir, pagar a entrada e tratar, meramente, de um assunto banal sobre uma dívida banal de um banco digital banal. Naquela tarde, PV fez um golaço ao cobrar uma “falta da entrada da grande área”, termos esses que Mia havia aprendido com ele.

Hoje, graças a Maria Clara, Mia Gurjão conhece muitos detalhes sobre Paulo Victor. Depois de prolífica conversa no Instagram com a amiga da namorada (sem que esta soubesse), o sujeito perguntou à mãe o horário exato do próprio nascimento e foi assim que Mia conheceu algo que ainda não sabia a respeito dele: PV também tinha Vênus em Escorpião. Não que tais configurações estelares importassem tanto para Mia, não eram os atributos astrológicos que ela desejava vislumbrar. Implorou, entretanto, que o rapaz ocultasse tal conversa da namorada, por razões meramente de horóscopo, já que Maria Clara, ora, era canceriana e não lidava muito bem com ciúmes. PV não compreendeu porra alguma daquela conversa, apenas o que lhe interessava: as progressivas interações por parte de Mia e o que isso realmente significava e onde isso de fato os levaria. PV, claro, como um sujeito ímpar e que tinha por honra atender aos instintos mais primitivos de sua criação e de sua natureza, muito ansiava por descobrir a textura, o calor e o acolhimento de tão pretendido lugar.

Das particularidades infinitas que orbitavam o  universo-Paulo-Victor, a inteligência em campo era a mais admirável. Sabido da inicial desconfiança da namorada, ao ser questionado sobre as investidas da amiga, PV fez-se de bobo. Estupefato, até. Mia Gurjão?! Mia teria, decerto, mais motivos para detestá-lo do que para minimamente notá-lo. Paulo Victor, como um hábil centroavante, utilizou a jogada a seu favor e listou todos os erros que até então cometera naquele relacionamento, enumerando-os e chutando os prováveis vacilos que certamente chegaram aos ouvidos de Mia. 

— Por exemplo — começou ele, já antevendo, desde o meio campo, a brecha para a jogada. — O que ela disse sobre o mês de Julho em Mosqueiro? 

— Quando tu deste carona pra tua ex?! Que merda isso tem a ver, Paulo Victor?

— Tem tudo a ver, meu amor. Contaste essa história pra Mia? O que ela disse sobre isso?

— Ela ficou puta. Ela me apoiou, pelo amor de Deus, né? Que merda. Por que me lembraste disso?

— Depois disso, ela nunca mais olhou na minha cara com qualquer sinceridade. A mina só me suporta. Achas mesmo que ela sentiria qualquer coisa por mim?

Maria Clara ficou calada. Nunca chegou a mencionar sobre a mesa de bar ao namorado, não daria qualquer pingo de autoestima nem a noção da própria fama que ele agora possuía na imaginação das pretty little liars paraenses. 

— Tu bem sabes que a Mia não gosta de mim — reafirmou ele. — A gente se suporta por tua causa.

— E todas essas mensagens? — Apontou ela para a caixa de entrada no Instagram.

— Eu não faço ideia — ele deu de ombros, mas suspirou ao final e preparou-se para finalmente se aproximar da grande área. — Mas bem que achei estranho. Tu achas que ela pode estar, realmente, interessada em mim?

— Acho — bufou, tola, a namorada.

— Em mim?!

— Sim!

O jogador então avistou o espaço aberto entre os zagueiros. Como Kaká contra o Manchester United na Liga dos Campões de 2006/2007, costurou-os com maestria:

— Eu não acredito nessa possibilidade, mas… — vencidos os zagueiros, havia apenas as duas imensas traves, a rede e um goleiro incapaz de bloquear o espaço descoberto no canto direito. 

A abertura infalível, o espaço desejado.

O centroavante respirou fundo.

— Já que você tá dizendo, eu vou acreditar em ti, amor — prometeu PV.

Ele impulsionou os músculos da perna direita para trás.

— Vais fazer isso por mim? — Perguntou Maria Clara, desarmada e esperançosa, alegre por o namorado acreditar nela e não tomá-la por maluca.

— Não vou dar bola alguma pra ela — o centroavante deu uma última checada no espaço desprotegido. 

— Por favor.

— Vou dar uma afastada, tá? — Com técnica e maestria, ele chutou a bola.

— Jura?

— Juro.

— Obrigada.

E fez o gol. 

Maria Clara relaxou a vigília sobre o centroavante. Nele, confiava com unhas e dentes e teve certeza de que as conversas pelo Instagram cessaram, embora, infelizmente, não houvesse se atentado aos demais estratagemas disponíveis nas lojas de aplicativo ou no empenho de um exímio jogador pessoalmente ensinar uma torcedora curiosa a respeito de regras ou de prolíficas jogadas. 

Outro dia, Maria Clara compartilhou com uma das Pretty Little Liars as desconfianças que vinha alimentando sobre Mia Gurjão, mas de maneira muito educada a ouvinte fez questão de apaziguar a paranoia que vinha corroendo a amiga há meses. 

— Olha, mana, tens certeza disso? — Perguntou, com leve desdém, a equivalente Emily Fields paraense.

— Certeza? Claro que não. Mas faz sentido?

— Por que tu achas que faria?

— Depois daquela conversa que a gente teve.

— Sobre o tamanho do pau do Paulo Victor e como ele te faz ou fez gozar cinco vezes seguidas?

Se Maria Clara fosse um tiquinho mais esperta, ou intuitiva, teria notado o tom imaginativo na voz da amiga. 

— É… achas que ela… sabe… Ficou…?

— Interessada, mana? A Mia? 

— Sim. 

A amiga riu da mesma forma com que Mia Gurjão vinha estranhamente rindo nos últimos meses.

— Amiga, eu sei que tu estavas muito empolgada naquele dia, mas a Mia, tu e eu já tivemos coisas bem melhores que o Paulo Victor. Me desculpa, eu sei que é o teu namorado, mas assim, mana, não viaja. Sinceramente, e a gente já te disse: o PV nem é tudo isso.

E se Maria Clara fosse um tiquinho mais esperta, ou intuitiva, teria notado o tom de inveja na voz da Pretty Little Liar paraense.

Inveja não dela, é claro.

Não de Maria Clara.

Mas de Mia Gurjão,

que estava a uma sentada de conhecer os detalhes mais proeminentes de Paulo Victor Gomes Feitosa.



 

22 de outubro de 2025

noxius





A característica de ser nocivo, nestes termos e nestas específicas circunstâncias, parece-me quase, quase congênita. É como o semear de uma semente ou a iminência do passado, que bate à porta todas as noites de sábado, ultimamente sempre aos sábados. Porém não é característica hematológica, não está correndo nestas veias como uma sina latente ou como um determinismo grego, é construção, tijolo sobre tijolo, ato sobre ato, vilipendiados todos através dos anos, cravados nesta demora de crescer, nesta demora de enxergar, a mesma demora com que o carboidrato corrói as córneas, retinas e todos os demais órgãos que te fazem não enxergar, que te fazem não ver, que te fazem abrir apenas o par de primeiras pálpebras, jamais o segundo.

É a permanência desse ar nocivo, desse ar atrasado, dessa demora de ver o tempo passar por estares preso ao presente, por não sonhares ou por não planejares. Por que o presente é confortável? Por que não percebeste a areia na ampulheta escorrer? Ou por que não notas quando esse teor nocivo te enche a boca, desliza pela língua e doma as ações? Ou as desações. O quê, diga-me, o que exatamente te faz assim? A criação? A memória de nunca ter pertencido ou estado em uma época boa da vida, por que em todas as épocas ou te arrependes ou tens vergonha do que foste? A criança mimada, tola, mal-criada por criação que não te cabia julgar ou perceber? A adolescência rebelde, igualmente tola e mal-criada, egoísta-sempre-egoísta e habitante de uma dor que nem deveria ser chamada de dor, tudo porque era uma dor patética e desprezível? Ou o início da fase adulta, uma soma cumulativa-destrutiva das duas primeiras, nociva sobretudo nas palavras e nos atos e na capacidade de expirar veneno & brasa & fuligem & hipocrisia? Ou foram os falsos privilégios sobre os quais a semente germinou, cresceu e agora precisa ser podada ao menos para não se enraizar em paredes e em estruturas de casas alheias? Em qual destes momentos a tua nocividade não proposital, mas igualmente demolidora, vai se apaziguar, desaparecer e dar origem a uma nova pessoa, àquela que precisam que sejas, àquela que anseiam que exista, àquela que parece ser a única, a única a não causar sempre&sempre tanto estrago, lágrimas e corrosão de sonhares?

 

Inclusive, ora, este próprio questionamento é fruto e será o semear de mais uma dessas tragédias.

 

Em que momento estas veias corrosivas,

arenosas &

venenosas deixarão de te assolar, correr por ti &

finalmente

te abandonar?

Até quando?



17 de julho de 2025

quando excluí meu diploma


 



And I went downtown to look for a job

I had no training, no experience to speak of

And I looked at the holes in my jeans

And I turned and headed back.

 

(Story of my life – Social Distortion)

 

 

Eram quatro e cinquenta e três da manhã quando excluí o PDF do meu diploma. Suspirei com pesar, porém com desencargo. Toda a frustração de mais de uma década havia sido incinerada do computador e de uma pasta no Drive. Excluir arquivo>esvaziar lixeira e em seguida>limpeza de disco para apagar qualquer vestígio dos 174kb que reduziam um terço da minha vida a fracassos e arrependimentos.  

Engraçado. Antigamente, não há muito tempo e antes de uma pandemia, os diplomas eram impressos e entregues pessoalmente aos sobreviventes das egóicas guerrilhas acadêmicas. Dizia-se que um ex-veterano ou uma ex-veterana aguardava por até um ano para receber um pedaço de papel, mesmo depois da cerimônia de maquiagens bem-feitas, roupas bem alinhadas e fotografias profissionais que jamais ganhariam álbuns ou visões, pois os preços eram exorbitantes e quem-em-sã-consciência-consegue-pagar-tudo-isso-nessas-fotos? Os tempos são outros. Hoje em dia, tais quais os diplomas, as fotos eram enviadas através da nuvem, em pastas com tempo limitado, sem teor físico e perecíveis à tecla delete.

Em profunda e sábia análise, para que aquele PDF serviria? Era meados de julho, exatamente um ano antes daquela madrugada, quando cadastrei meus dados na recepção do Parque Office e fizeram o registro da minha biometria facial. Na mensagem de texto recebida no dia anterior, indicavam-me a sala comercial 907, mas o entrevistador nos encontrou no chique hall e nos conduziu até a sala 109. A entrevista foi rápida, fácil até: quais os seus objetivos? quais os seus sonhos? Como você se enxerga daqui a cinco anos – e essa, confesso, foi a emboscada mais cruel, sobretudo para mim, um sujeito meio Charles Bovary. Todas aquelas perguntas foram vencidas na boa base da mentira e da quase-impecável oratória. Não é sobre dicção. É sobre oratória. Escolhas lexicais. Quais verbetes utilizar e quais palavras encaixar. Concordância nominal. Concordância verbal. Conectivos bem-dispostos, não os incomuns que quase não se escuta, não aqueles utilizados em textos acadêmicos e estrategicamente escolhidos para evitar repetições e não tornar a produção redundante, mas os preciosos de se escutar, que te amaciam os ouvidos e impressionam aqueles que não estão tão habituados a encontrá-los. Não. Não é sobre dicção, pois a minha é péssima, um fiasco - sequer desenvolvida em mais de dez anos num curso que deveria durar apenas quatro.

Não, não é sobre uma oratória impecável.

É sobre mentiras.

— Quantos anos tu tens? — perguntou-me o entrevistador.

— Trinta.

— Trinta? Mentira.

 [Risos cansados, porém dissimulados] é verdade. 

Essa era uma verdade, uma das poucas.

— Me deixa ver tua identidade — pediu ele.

[Entreguei o documento]

— Caramba, nem parece — respondeu-me o rapaz que certamente deveria ser 43 anos mais novo que eu. — Bacana. Muito bem. Podes me acompanhar? Vamos à sala onde o [nome fictício] vai te explicar como vai ser nossa semana de treinamento. Dependendo do teste de hoje, vocês serão chamados para retornarem amanhã.

— Certo.

Somos conduzidos, eu e outro candidato, a uma sala no andar de cima onde vários outros candidatos estão sentados. Todos impecavelmente vestidos com suas melhores roupas para uma entrevista ou seleção de emprego: camisa social branca, calça preta e sapato social. Naquela sala, o [nome fictício] nos apresenta o funcionamento do negócio, o regime de trabalho PJ e a altíssima porcentagem de 0,007% de comissão em vendas que variam entre 100 mil e 1 milhão de reais. Nosso negócio de consórcios de moradia é garantido e, melhor: não trabalhamos com regime CLT (é claro, não estamos dizendo dessa forma, não tão explicitamente assim), aqui sua comissão depende inteiramente do seu esforço e do seu trabalho!

— É CLT? — Pergunta outro entrevistado, tão mais novo que eu e superiormente mais maduro. De longe, parecia ser o mais esperto entre nós, já que não voltou nos dias seguintes de treinamento.

Eu soube da idade dele porque quando minha foi perguntada por [nome fictício], não pude inventar mentiras e a isso vieram as respostas corriqueiras de sempre, que me soam mais como lembrete de fracasso do que elogio à uma aparente juventude.

No entanto, diante da pergunta, [nome fictício] ignorou com o mais sagaz dos dribles de vendedor.  Por outro lado, [nome fictício] também era um cara legal. Homem alto, bonito, simpático e de pose madura e desenvoltura que, aos 30 anos, eu jamais conseguiria. Ele só tinha 26. Pai de família. Casa própria. Contou-nos que começou com um negócio na feira, cujo aluguel a locadora cresceu os olhos ao menor sinal de sucesso. Sem perspectivas, sem carteira assinada quando foi apresentado àquele ramo. Ele começou no mesmo lugar onde estávamos: naquela sala, primeiramente como consultor de vendas, com a única e exclusiva tarefa de passar o dia inteiro fazendo ligações a prováveis clientes que deixavam seus números pela internet, agendar com uma reunião em que eles, os gerentes como o [nome fictício], fariam o restante da negociação.

— Se fecharem negócio, vocês terão os seus 0,007% de ganho. Estão vendo o [mais um nome fictício] aqui? Só no mês passado ele realizou seis vendas que totalizaram um milhão e cem mil reais. Fizemos uma festa pra ele — [nome fictício] mostrava fotos em um slide. — Ele recebeu a comissão de 0,007% e mais uma televisão de 43 polegadas. Fantástico, né? Esse é o caminho que vocês podem alcançar.

Mas como eu disse, [nome fictício] realmente parecia um cara legal. Ele se afeiçoou, contou que me emprestaria livros de perseverança e de estratégia de negócios, parecia ter enxergado em mim (não nas entrelinhas, pois nas entrelinhas, mesmo casado, havia oferecido carona para uma das colegas entrevistadas) algo promissor, um pupilo ou uma isca cega para o negócio de consórcios, sobretudo depois daquela redação eliminatória que escrevi: um amontoado de mentiras inflamadas por um discurso sonhador e embebedado de meritocracia barata. Viu? Não é questão de escrever como Nelson Rodrigues ou como uma Clarice Lispector, não é sobre falar com a eloquência e a cadência de uma Érika Hilton. É sobre mentir. Introdução, desenvolvimento e conclusão. Coesão e coerência. Conectivos bem encaixados. Escolhas lexicais certeiras (aqui, sim, faça uso das palavras incomuns!). Concordâncias nominal e verbal. E só para finalizar, um toque muito sutil e impactante de poesia. Sem teor artístico. Apenas teor mercenário. Você precisa de um emprego. Seja ele qual for. Mesmo um em que a você, dia após dia daquela semana, sem auxílio de transporte ou de alimentação, ensinem a espalhar fotos irreais de casas na OLX ou em grupos de Facebook. 

— E apenas em uma delas — ensinou-nos [nome fictício] no terceiro dia de treinamento —, em apenas uma dessas fotos vocês colocam, em uma fonte muito pequena, quase imperceptível, a legenda “imagem ilustrativa”. Não estamos vendendo casas. Somos um consórcio. Vendemos a oportunidade da compra da casa. Quando o cliente fechar negócio com a gente, liberamos o dinheiro e o cliente vai atrás do terreno. Entendem?

— Então não somos, tipo, corretores? — perguntou a [moça de nome fictício] a quem [nome fictício] havia oferecido carona.

— Não, não somos.

— E se questionarem de que empresa somos? — perguntou o [outro rapaz de nome fictício], que acabara de sair de uma famosa pizzaria da cidade e enxergava naquela oportunidade um caminho rápido para o sucesso absoluto, coisa que um regime CLT jamais proporcionaria. Não que ele estivesse errado sobre a segunda parte.

— Vocês não respondem. Nem começam a ligação informando que pertencem à [nome fictício da empresa de consórcios]. Isso não importa. Os clientes já deixaram o número deles com a gente através de tráfego pago.

— Ok — todos respondemos.

E enquanto toda essa ladainha nos era explicada, e enquanto eu avancei até o terceiro dia naquele estranho ambiente que cheirava ao mais puro coach e iniciava, desde oito da manhã, uma rotina exaustiva de ligações com discursos eloquentes e decorados, gritos ritmados à la super palestras de RECUPERE SUA MASCULINIDADE E SEU LEÃO INTERIOR, e enquanto até o bater de um sino dentro daquela sala minúscula com 20 pessoas espremidas, para motivar a [nome fictício da equipe que sinceramente não lembro mais o nome], eu pensava:

isso até parece com esquema de pirâmide, mas eu preciso de um emprego.

Tudo isso para dizer que, durante os dias de treinamento, todos os líderes de venda me perguntaram uma e duas e até três vezes de o porquê eu estar ali:

o [primeiro nome fictício], o cara legal; o [segundo nome fictício] também era professor por formação. Um sujeito igualmente legal e que teve, em algum momento, pela mais pura necessidade ou ingenuidade ou falta de senso crítico ou todas essas coisas juntas, o destino de seguir aquela profissão, editando fotos ilustrativas pela internet e atraindo pessoas que sonhavam com a casa própria, custe o que custasse, com a mesma necessidade ou ingenuidade ou falta de senso crítico que me levou até aqueles três dias de treinamento; e o [terceiro nome fictício], este homônimo ao meu, era um sujeitinho chato, com a clichê arrogância das bichas-más orbitando o umbigo, sempre fazendo questão de esquecer o nome de todos os candidatos, inclusive o meu, que era o dele também, e de não nos deixar falar até o final, exceto o rapaz que trabalhou na pizzaria, por quem desenvolveu instantâneo interesse puramente profissional, claro.

A todas as perguntas deles, eu respondia:

— Eu só dou aulas de reforço. Tenho um único aluno e embora a família dele seja muito generosa, amiga e parceira comigo, já estamos em julho e eu tô sem dinheiro. Eu ganho dinheiro quando ele precisa ter aulas ou às vésperas das provas. Em meses de férias escolares eu fico quebrado e não quero depender disso, o que eu quero mesmo é

depender de um regime de trabalho CLT. Repetitivo. Massivo. Um emprego, qualquer um, que não exija de mim a formação de cidadãos pensantes ou o comprometimento mental com crianças e adolescentes e adultos que vão me olhar com desprezo e questionar “por que é que eu preciso estudar isso? eu nem gosto de português”. Mas nenhum desses empregos me aceita. Desqualificado demais. Sem experiência demais. Sem nada a provar. Sem nada a oferecer. Sem sequer o tempo de vida a ser vendido valendo a pena. Eu só queria um emprego CL...

— Mas, lembrem-se — ecoou a voz do [nome fictício em minha cabeça] —, não trabalhamos em regime CLT — Era o que sempre respondiam nas entrelinhas. — Somos um regime PJ e isso garante mais autonomia de tempo e liberdade financeira a vocês. Combinado?

— Combinado — respondíamos em desespero.

No quarto dia de treinamento, ignorei o despertador do celular. Quando me questionou por mensagem, respondi ao [nome fictício]: desculpa, mas não vou mais poder ir. De antemão, agradeço pela oportunidade e por todas as coisas que aprendi nesses últimos dias.

(percebe? outra mentira bem contada).

O que aprendi naquela semana foi que a minha formação não valia de nada. O [segundo nome fictício] também era professor e havia optado por aquele caminho, porque a experiência na docência não é feita para todos e nem todos a desejam. Minha capacidade de escrever e de dizer boas mentiras nem era tão boa assim, não para aquele ofício de vendedor e de ludibriador via-celular.

Incapaz de passar a perna,

incapaz de professorar. 

E, acima de tudo,

honesto demais para fingir qualquer uma dessas tarefas.

Até Charles Bovary tinha suas próprias utilidades. 

Esta formação não tem me servido sequer para algum emprego na cidade: recepcionista & vendedor & vendedor interno & vendedor externo & vendedor porta à porta & atendente & atendente em regime temporário (mês de julho > com necessidade de contratação urgente!) & atendente de motel & home office & auxiliar administrativo & auxiliar administrativo home office & auxiliar de cozinha & auxiliar de serviços gerais & call center & vendedor & vendedor de artigos esportivos (candidatos com 1,80m de altura e com interesse por esportes) & consultor da alegria & estoquista & caixa (com experiência mínima de setenta e cinco anos) & vendedor & mais vendedor de novo & seja lá o que Deus não reservou para mim. 

Eram quatro e cinquenta da madrugada quando eu ainda tinha na tela diante de mim o diploma aberto em arquivo PDF (deuses, eles nem mais entregavam impresso pra que você pendurasse seus desperdícios numa moldura): 

 

O Reitor da Universidade [nome fictício do estado fictício], no uso de suas atribuições e tendo em vista a conclusão do Curso [nome fictício] em 09 de [mês fictício] de [ano fictício] e a colação de grau em 21 de [mês fictício] de [ano fictício], confere o título de Licenciado em [nome de curso fictício] a

 

[meu nome não-fictício]

Carteira de identidade [nº não-fictício] [órgão não-fictício/sigla de estado fictício] de nacionalidade brasileira, nascido(a) em [dia & mês & ano fictícios], natural do [estado fictício]

 

e outorga-lhe o presente diploma, a fim de que possa gozar de todos os direitos e prerrogativas legais.

 

[capital/estado fictícios], [dia & mês & ano fictícios]

[nome fictício]

Reitor.

 

Não estou gozando, senhor Reitor. Não estou gozando desde os meus dezoito ou vinte anos de idade e não tenho gozado muito por aí. Exceto, é claro, neste momento: 

já são cinco em ponto da manhã e um peso imenso parece ter sido retirado dos meus ombros após excluir o PDF. O mesmo peso que me foi retirado naquele mês fictício de um ano fictício. Quer saber de algo que não é mentira, senhor Reitor? Pois bem, aqui vai: contra todos os meus esforços, eu fiquei feliz na tarde daquela cerimônia de maquiagens bem-feitas, roupas bem alinhadas e fotografias profissionais que jamais chegaram a ganhar álbuns ou visões, pois os preços foram exorbitantes e só-um-trabalhador-CLT-em-sã-consciência-consegueria-pagar-todo-esse-preço-exorbitante-naquelas-fotos-perdidas. 

Contra todos os meus esforços, naquela tarde de um dia fictício de um mês fictício & de um ano fictício, eu estive feliz. E esta não é uma mentira bem elaborada com porca oratória ou boa coesão e coerência. Embora você, caro Reitor, não seja capaz de ver nas fotos que nunca existirão nem serão divulgadas por aí, eu estive feliz. Não porque houve a promessa de um diploma físico ou digital. O diploma pouco importa. Não fiz pelo diploma. Ele existe apenas no lixão digital ou na burocracia acadêmica que não farei questão de ir atrás, nunca mais.

O diploma importa tanto quanto um autor que nunca terá seu livro publicado por alguma editora que aceitou o original, porém jamais enviou qualquer contrato, mesmo sob ingênuos pedidos. O diploma + a obra não publicada, tendo existido uma única vez, já cumpriram com sua função; não são coisas para se estampar ou para se esbanjar, sequer para serem comemoradas.

São coisas que existiram e por terem existido, bastaram.

É como escrever:

você não escreve para ser eterno ou para provar algo a alguém. Você escreve por desencargo, bem como exclui diplomas pela mesmíssima razão.

Nem tudo precisa existir para ter algum valor.

Às vezes, e bem frequentemente,

as coisas existem e não possuem valor algum.

A única coisa valiosa que deixei para trás, infelizmente, foi aquele emprego em regime PJ de consórcio imobiliário com fotos de casas meramente ilustrativas. Era o emprego dos sonhos. O único que me aceitou, que cagou para a minha inútil formação e me chamou mesmo assim. O único a me dar o devido valor.

E isso não foi uma mentira.

 

 

 

19 de outubro de 2023

O dia em que fui primeiro lugar no 32º Concurso de Contos Paulo Leminski


        


        Feriado. Dia das crianças. Uma semana atrás. Eu estava prestes a tomar banho para dar um rolezinho no ITA quando veio a notícia.

Dias antes disso, recebi um e-mail meio inesperado: a divulgação dos vencedores do 32º Concurso de Contos Paulo Leminski seria naquela semana e eu estava entre os finalistas. Meses antes, deparei-me com o edital do concurso e pensei: “E se?”. Fui lá, procurei o que possuía na gaveta e encontrei aquele conto escondido, escrito para compor o “Napalm & histórias de amor”, mas que ficou de fora por destoar um pouquinho da temática central do livro. Aí fiz o que qualquer um que escreve sempre faz: relê, fica insatisfeito, começa a mexer aqui, a mexer ali, a cortar isso, a ajeitar aquilo… finalizei. Preenchi a inscrição e enviei. Era isso. O “não” eu já tinha, de qualquer forma. Você sempre tem um enfático “não” a seu favor.

Vá lá e seja teimoso.

Corta para os dias anteriores ao resultado: eu, recebendo o e-mail e sendo apossado por aquela suave expectativa atrás da orelha, até ansiedade, uma remota possibilidade de que, talvez, até dê certo. “E e se? Vai que, né?...”. Em seguida, a cena em que do nada, do nadão, assistindo à transmissão ao vivo, já desesperançoso de sequer ser escolhido para participar da coletânea, meu nome é anunciado:


“E EM PRIMEIRO LUGAR, COM O TÍTULO ‘MARIANNE’, AUTORIA DE FELIPE SANTIAGO, DE BELÉM DO PARÁ [...]”.




Na hora em que o título “Marianne” foi anunciado eu já estava no espaço. Sou meio totalmente fleumático. Fico extremamente feliz e empolgado, mas tenho dificuldades de reagir. Corporal e expressivamente mesmo. Acho que fiquei incrédulo. Não era possível. Eu? Eu? Justo eu? Sério isso? Surreal. Fiquei o restante da noite anestesiado.

O Paulo Leminski é um concurso de contos importante e de tradição, com gente do Brasil inteiro e residentes em outros países enviando as mais incríveis e bem-escritas narrativas. Anos atrás eu já havia submetido um conto, mas o bichinho era fuleiro e muito ruim, na época em que o que eu escrevia era igualmente fuleiro e muito ruim (não que eu seja um Machado hoje em dia, mas garanto que, comparado àquela época, alguma maturidade na escrita já me sonda). Foram 740 contos inscritos. Gente talentosa para um caramba. E dentre todos eles, “Marianne” foi se esgueirando e conquistando os membros da comissão julgadora a ponto de ser escolhido em primeiro lugar. Fico muito feliz por isso, porque esse é um conto cuja mensagem é valiosa e necessária. Agora estou ansioso para que o mundo o leia.

Quero agradecer a todos da organização do concurso: à prefeitura de Toledo, à equipe da Secretaria de Cultura e aos jurados que confiaram no valor dessa narrativa. Também a todos que me parabenizaram e que, de um jeito ou de outro, sempre estiveram por aqui dando forças e incentivos morais, principalmente quando tudo o que me sondava (e sonda) é a desesperança, o desânimo e a falta de fé em mim mesmo. À minha família que sempre me glorifica ao extremo - às vezes até demais,  mas não é culpa deles, é que ficam empolgados e entendo. Aos meus amigos que, muito embora tenham diminuído ao longo dos anos, continuam frequentando este reles e ainda existente blog, adquirindo ou se interessando pelas antologias das quais faço parte. E, acima de tudo, quero agradecer à Divona, por estar sempre ao meu lado, literalmente ao meu lado no momento da divulgação. A pessoa que sempre chora com as minhas pequenas, grandes e esporádicas conquistas.  

Fico sem graça de comemorar, mas eu tô bem feliz - daí a existência desse textão. É um baita de um gás para quebrar a programação normal.

Abaixo, deixo uma matéria publicada pelo Jornal do Oeste, falando sobre a 2ª Flit, em Toledo, e sobre as premiações do 32º Concurso de Contos Paulo Leminski e do 9º Concurso de Crônicas e Poesias Edy Braun, além do link da live completa ocorrida no dia.

Obrigado a todo mundo novamente.   


F.


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2ª Flit: sucesso comprova sucesso de ações de incentivo à leitura em Toledo: https://www.jornaldooeste.com.br/toledo/2a-flit-sucesso-comprova-sucesso-de-acoes-de-incentivo-a-leitura-em-toledo/


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Live com a programação do último dia da 2ª Flit:

https://www.instagram.com/reel/CyULB3Pr6I7/?utm_source=ig_web_copy_link&igshid=MzRlODBiNWFlZA==