Logo ela, que esteve tão presente em cada
perspectiva minha de planos, expectativas ou sonhos, agora me assola da maneira
que menos imaginei. Logo ela: essa morte tão
eminente, voraz e inevitável, que agarrou-se em cada ato, desato, em cada palavra dita e sobretudo as não ditas. Impregnou-se
nos abraços e infestou-se nos beijos meramente beijados. Logo ela, essa morte tão
profetizada que não me deu horas para o preparo, nem segundos para a
antecipação necessária; logo ela que veio antes do aviso, veio sem aviso, apressada com décadas de adiantamento. Essa morte que contrariando as
expectativas do público, não partiu de mim – pois está aqui o meu complexo de Cassandra, está exatamente aqui
a minha inicial e milenar consciência de que a morte me aplacaria vindo de fora
e não de dentro, pois seria eu aquele jogado na cova, e não aquele que joga. Vindo
de fora, partindo do outro lado da margem e daquele peito atrelado às confusões
de braços e pernas sobre a cama, através de beijos frívolos, mordiscadas no
lábio inferior ou um olhar enviesado de desconcerto, eu sempre soube que um dia
a morte chegaria, só não imaginava que tão cedo, só não imaginava logo quando eu finalmente vinha me encaixando.
Porém a morte é tão culpada por matar quanto a
lesma por existir, e de todas as causas pertinentes, eu estive em quase todas elas – mas para o bem da
prosa e da vã poesia, pelo bem de todos os envolvidos, é melhor dizer que “estive em todas”, com absoluta
precisão. Pois fui eu que a causei e por ela implorei: nas letras brincadas,
nas melodias desprezadas, nos elogios não feitos e consequentemente em todos
aqueles esporádicos cavalheiros que o fizeram por mim incessantemente ao longo
de uma vida inteira em que permaneci calado, imóvel, indiferente. Por todos ou os poucos cavalheiros que o fizeram e
conseguiram, alcançaram o pódio, conquistaram a glória. Pela aproximação
dessa morte eu aceito a culpa, não de forma dramática, melódica ou vitimista,
apenas a aceito com estranha consciência que vez ou outra possui seus picos de
escárnio, ódio e cólera.
Como bem disse Hank Moody:
Como bem disse Hank Moody:
“Estou aceitando culpa por tudo. Vulcões,
terremotos, derramamentos de petróleo, esteroides, músicas de rap. É tudo minha
culpa”.
Toda minha,
mesmo sabendo que cada ato que me trouxe até aqui, no final, ora, cedo ou tarde
me traria até aqui. A única peça
consciente que faltou nessa estranha consciência foi a ponderação da dor, do
descontrole e da perda das capacidades de maturidade, pois não há sabedoria que
o prepare para a troca, não há filosofia que o faça aguardar, de fato, a tão
lamentável morte.
E se morremos
desde já ou desde sempre, isso sempre foi minha culpa.
Minha e de mais ninguém.
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