9 de junho de 2014

No fim do dia



No fim do dia, eu não sou um escritor.
E nem quero ser. E nem mereço ser. Escritores são mais que eu, mesmo aqueles mais urbanos, sujos e viscerais, mesmo aqueles mais alcoólatras e que vivem vivendo. Estes são mais do que eu em qualquer coisa que eu me empenhe. No fundo, nunca aceitei essa ideia, porque ela é boa demais para mim, é grande demais, é indigna demais. Não. Eu não sou nada. Sou um nada satisfeito com alguns elogios aqui e ali, mas não me julguem por escritor. Não canonizando o título, já que qualquer pessoa pode segurar um lápis ou digitar diante de um teclado e arquitetar e construir obras magníficas - qualquer um -, mas seria prepotência minha estufar o peito para fazê-lo, até porque se eu tiver de me intitular de algo, então será por “fraude”. Fraude mais para o certo. Uma boa fraude fazendo coisas vez ou outra legais, memoráveis entre alguns pequenos círculos e dignas de esquecimento ao fim do dia – sempre ao fim do dia. É o que faço, afinal: uma coisa boa e maneira, que irá surpreendê-lo por alguns segundos e depois nada. Ou por um dia. Ou por uma semana. Quiçá por um mês. Pronto. Escritores estão além disso, escritores são verdadeiros, vivem o que escrevem e escrevem o que vivem. Eu sou fraude, a fraude que mesmo contando uma inteira verdade, será taxado por mentiroso e sonhador – no sentido mais pejorativo. Escritores são mais, muito mais, por isso o eventual incômodo em ser chamado assim. Eu não tenho talento, eu não tenho compromisso, eu não tenho responsabilidades, eu não tenho maturidade. As pessoas continuam rindo de mim, não importa quantos anos passem, não importa quantas verdades eu viva ou omita com a boca. Ao fim do dia, eu só quero deitar e esquecer de lembrar que amanhã virá mais um dia, e que eu continuarei a ser uma fraude e uma piada ambulante.
No fim do dia, eu não sou um escritor. Não me chamem disso.
Por favor, não tirem meu sono.



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