Chegou como quem não queria nada. Sentou-se.
Certificou-se de que os botões dos punhos estavam bem apertados. Ligeiramente
acertou os moldes da roupa, olhando por um reflexo qualquer como estaria o
improvável desalinho. Depois disso não deu a mínima bola para a própria aperência,
talvez não precisasse daquilo. Sabia o quão altivo era com aqueles cabelos
pretos que, juro, por vezes aos meus olhos soavam castanhos, outras horas
pareciam quase avermelhados, num bronze envergonhado. Olhou pra mim e soou
apressado – vamos, garotinho, tenho um
contrato às 16h30. Fazia um calor dos Infernos e minhas costas ensopadas
ainda se recuperavam sob o frio do restaurante. Ele não. Ele estava tranquilo,
mesmo sob aquela roupa. Assenti devagar e ele olhou no relógio de pulso. Pôs a
mala preta sobre a mesa e com dois clics abriu-a. Papéis, papéis, e papéis.
Papéis velhos, fedorentos, cheirando a grilo e a mofos. Quando pensei “maldito grileiro” ele se irritou e
balançou a cabeça, profundamente indignado
com a ofensa. Pedi desculpas e microscopicamente deu de ombros. Caçou minha
papelada e me entregou.
- Pernas longas, kilos adicionais,
doses de auto-estima e um pouquinho de talento. Mais alguma coisa?
- A beleza. – Respondi, repassando a clausura.
- Você é lindo aos olhos do Pai.
- Eu estaria aqui se concordasse?
- Certamente. – E riu. Riu
verdadeiramente divertido pela primeira vez desde que chegara. – Você não
mencionou a beleza antes.
- É verdade. Comecei a pensar sobre ela ainda agora.
- Eu não tenho tempo. E aí?
- E aí o quê?
- O que vai ser? Vai adicionar?
- Nesse papel? – Ergui o contrato. O
aroma das traças bailou pelas minhas narinas.
- Eu dou um jeito, tudo pelo cliente.
O que vai ser?
- Acho que não. Beleza e dinheiro
custam muito.
- São os mais pedidos.
- É. Fico com os que já estão aqui.
- Perfeito.
- E aí?
- É só assinar.
Assinei. A caneta dele era legal. Brilhosa
demais. Pesada demais. Normal demais.
- Juro que pensei que isso seria mais bizarro.
- A Firma se adequa ao contexto. Quanto
mais facilidade, melhor. – Alargou um sorriso e apertou-me a mão com um toque
confiante e amigável. Jurei que por um segundo que seus cabelos eram dourados. –
Foi uma honra fazer negócio com você, Felipe.
- Eu não diria o mesmo, mas é isso aí.
Obrigado por aparecer.
- Disponha!
E saiu apressado. Nunca mais o vi
desde então.
O contrato tem surtido efeito e o
produto é realmente confiável.
Valeu a pena.
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