11 de setembro de 2017

acho que vou chamar essa prosa de Paola



As batidas me salvam de um sonho ruim.
Onde quer que eu estivesse, havia coelhos andrógenos antropomorfizados com bengas gigantes invadindo o barco que eu ganhara na loteria e via a loirinha que amo se enrolar nos braços de outra garota. Agradeci pelas batidas. Malditos sonhos intensos.
Eu levanto. Meu sono é pesado e se as batidas estavam fortes e me acordaram, então quem quer que fosse o pobre coitado, estava ali há horas.
Desço as escadas.
Olho o celular.
São quase duas da tarde.
- Já vai.
BAM BAM BAM BAM PAW PAW PAW.
- Já vai.
BAM PAW POW BAM POW POW POW BAM.
- JÁ VAAI.
Escondo as garrafas de catuaba no balde de lixo, puxo as embalagens de macarrão instantâneo do fundo para cima e encapo a prova do crime melhor do que encaparia outras coisas.
BAM BAM BAM BAM POW POW BAM POW POW POW BAM.
- Já to indo, eu juro!
Abro a porta, mas não muito. Estou só de cueca e você não liga para pijamas ou casas arrumadas quando tem vinte e três e não liga de andar livremente por salas, quartos, cozinhas e ficar no banheiro por horas misturando lágrimas ao som de Elton John.
Você não liga para porra nenhuma.
- Ele não tô. – Enfio a cara inchada entre uma fresta e me escondo atrás da porta.
- Porra, Felipe, eu quase desisto.
- Que bom que tu não és eu. – Abro os olhos e reclamo da claridade. Esfrego os olhos. Abro os olhos. Eles não abrem.
Mesmo batendo há horas, Paola está sorrindo aquele sorriso de dentes brancos, gigantes e me encarando com aqueles olhinhos indígenas, quase tão fechados quanto os meus – porém de forma linda.
- Eu trouxe comida. – Ela levanta uma sacolinha da Yamada.
- Ainda fazem sacolas da Yamada?
- Ahhh... tecnicamente a Yamada ainda não fechou. Abre logo, Felipe.
- Ahhh... tecnicamente eu to de cueca, deixa eu colocar uma roup...
- Frescura, é só abrir. Abre.
- Tá, tá.
Faço um ágil e rápido esforço para ninguém passar e me ver de cueca. Ela entra e me dá um abraço, Paola diz que
- Tu tá suado mas até teu suor é cheiroso, filho da puta.
- Obrigado, obrigado.
E Paola me abraça mais forte e joga a sacola da Yamada que eu não sabia que ainda produziam em cima do balcão. Paola tem aquelas lindas pernas magras e compridas que dão a ela uns dez ou mil centímetros a mais que eu, que fazem-na beijar minha testa sem dificuldades e que fazem-na encaixar meu corpo no dela sem a menor restrição corporal, física ou moral.
Ela ajeita meus cabelos que estão amassados para o lado errado e até as remelas do meu olho ousa limpar, mas aí faz careta e diz que
- Não vai acostumando com isso.
E eu digo:
- Sim, senhora.
Paola continua sorrindo. Paola é aquele tipo de mulher que você nunca imagina que o admira ou que irá à sua casa com sacolinhas da Yamada e com o coração cheio de carinho. Paola é aquele tipo de mulher que sai por aí lutando contra governos golpistas e sai por aí conquistando corações e se engraçando com mais mulheres que seus personagens mentirosos e galanteadores conseguiram, juntos, ao menos encostar. Paola até estuda as mesmas Letras que você, Paola até chora as mesmas lágrimas que você e até demoniza os mesmos vilões que você. Paola é aquele mulherão da porra. Você não acredita, mas Paola está ali.   
Ela continua com aquele sorrisão enorme de dentes brancos e aqueles tracinhos indígenas e aquele corpo magro e esbelto de seios que cabem perfeitamente entre o afagar dos meus lábios. Paola diz que gosta disso.
Eu também gosto.
- Vou tomar um banho e a gente almoça, me espera rapidinho?
- Porra, Felipe. Não.
- Não?
- Não.
- É rapidinho, só pra tirar a remela da car...
- Não. – Paola se enrosca em mim e sorri, mas aqueles dentes brancos somem porque agora Paola me dá um sorrisinho diferente e, mesmo eu sendo lento, lerdo e atrapalhado, consigo decifrar. – Não espero. Eu vou contigo.
Eu sorrio e tudo o que consigo dizer é:
- Sim, senhora.
Paola sobe comigo.
São quase duas da tarde e o calor de Belém agora é propício.
Paola continua a sorrir com aquele sorrisão de dentes brancos e traços indígenas.
Paola é a coisa mais linda que vi esta semana, Paola é a coisa mais linda que ouso tocar em muito tempo.
Outro dia, Paola me pediu um texto.

Esse texto é pra Paola. 

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