29 de março de 2014

A eterna piada



Por que ele ria tanto? Simples: a vida era uma eterna piada, muitas vezes com um sádico humor negro, tingindo vez ou outra de vermelho escarlate, mas ainda assim uma piada. E por isso ele ria, por isso ele fazia piadinhas em momentos tensos, onde as pessoas insistiam em parecer sérias. Era o seu modo de sobreviver, afinal de contas, embora ninguém entendesse, embora todos julgassem por imaturidade. Imaturo? Não. Não, vos afirmo que não. Ele sabia observar, ele sabia o podre de cada um, ele sabia quando falavam mal, quando soavam verdadeiros, quando mentiam e quando se valiam de falsidades. E aí ele brincava, brincava porque julgava-se superior aos outros, pelos menos nesse sentido. As piadas o faziam de bobo, e o maior prazer era esse: vejam-me como um bobo, interpretem-me como um bobo, tratem-me como um bobo, porque bobos não são levados a sério, bobos são imunes, bobos são eternos observadores, catalogando relações humanas, guerras e intrigas, bobos estão à parte, à margem do fogo cruzado, rindo e lamentando a hipocrisia humana. Era tão simples. Para ele, não importava ser taxado de criança, não importava que os outros o olhassem com olhos de desprezo – aliás, era isso o que o mundo sempre fazia, e depois de muito sofrer por isso, ele aprendeu a usar ao seu bel prazer, aprendeu a usar a seu favor. E aí continuou com as brincadeirinhas, as piadinhas, enquanto pessoas próximas a ele se matavam em fofoquinhas, em intrigas e estúpidas justificadas pelas variações de hormônio. E que a ele fossem atribuídas culpas por coisas que não fez, que a ele fossem atribuídos atos maximizados em função de situações que, no fundo, em nada tiveram caráter maldoso ou intencional. Que o mundo atribuísse a ele interpretações errôneas, ele não ligava mais; que o julgasse inocente demais, que o julgasse imaturo demais, que o julgasse sonso demais. Ele não ligava, sinceramente, era sempre engraçado. Talvez fosse o estado da pseudo ataraxia que pensava possuir ou talvez fosse o costume com tanta merda cagada por tantos ânus puritanos e castos. “Puritanos e castos”, hm, melhor dizendo. O eterno Morionem, dando voltas e voltas na fútil seriedade que o mundo tentava empregar em coisas irônicas e engraçadas.
Por isso ele ria tanto. Por isso ele não parava de rir.

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