7 de novembro de 2012

Realidade




É à noite que os medos dele atormentavam, talvez por isso madrugadas inteiras são tecidas de olhos abertos e xícaras já frias de café. O temor de pregar os olhos latente e palpável ganhava força a cada dia, já não eram somente os pesadelos que o assustavam, e sim as formas de vida que as sombras ganhavam em seu quarto. Por alguma razão estranha, nas poucas vezes que conseguia deitar para dormir (quando se esforçava a isso), insistia em deixar as luzes apagadas por duas razões: primeiro que ele não era acostumado a dormir no claro e, segundo, necessitava superar esses medos infantis. Mas alguma coisa o dizia que existiam monstros de baixo da cama, demônios profundos moldados no interior mais obscuro de sua criativa mente; mãos ensanguentadas saíam das paredes para acariciá-lo os cabelos; humanoides deformados arranhava e faziam “toc-toc” na janela acima de sua cabeça; espectros negros ganhavam forma nas intersecções das paredes do quarto, movimentando-se como nuvens de um dia tempestuoso. A pior parte, no entanto, era ter de imaginar que algum dos familiares estaria – e de fato está - a ponto de chegar ao fim da jornada, porque acidentes acontecem o tempo inteiro e porque alguns deles já estão idosos. Na realidade, ele tem medo de ficar sozinho porque sabe que a presença dessa ideia é iminente. Mas apesar de toda a tormenta que poucos sabem que se abate dentro de sua cabeça, ele ainda consegue dormir. Seu problema não é a insônia, afinal. Os monstros psicológicos de sua mente são fruto da própria criação, já que no ofício do dia, o garoto não vai escrever sobre seus medos e pesadelos, pelo contrário: é por tanto pensar nesses demônios, que ele acaba tendo os pesadelos. Entendem? Ele dá vida aos próprios medos através das palavras, não os medos que dão origem às palavras. Sim. Na realidade, seus tormentos monstruosos são consequência e não a causa. Esse acaba sendo o preço por imaginar demais. Mas no fim, há de virar costume.
Sempre vira.

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